IMUNIZAÇÃO CONTRA HEPATITE B EM PACIENTES RENAIS CRÔNICOS SUBMETIDOS À HEMODIÁLISE: UM ESTUDO TRANSVERSAL

IMUNIZAÇÃO CONTRA HEPATITE B EM PACIENTES RENAIS CRÔNICOS SUBMETIDOS À HEMODIÁLISE: UM ESTUDO TRANSVERSAL

IMMUNIZATION AGAINST HEPATITIS B IN CHRONIC RENAL PATIENTS UNDERGOING HEMODIALYSIS: A CROSS-SECTIONAL STUDY

INMUNIZACIÓN CONTRA LA HEPATITIS B EN PACIENTES RENALES CRÓNICOS SOMETIDOS A HEMODIÁLISIS: UN ESTUDIO TRANSVERSAL

Autores

Andréia Aparecida Henriques Carvalho- Mestre em Saúde Coletiva, Enfermeira no Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) - Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7276-0138

Elisa Oliveira Marsicano de Souza - Doutorado em Saúde pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Professora Adjunta da UFJF/Faculdade de Enfermagem. https://orcid.org/0000-0001-9960-3968

Fernanda Ismaela Rolim Teixeira- Especialista em Saúde Renal na modalidade Residência Integrada Multiprofissional em Saúde. Enfermeira assistencial e preceptora na Hemodinâmica do HU-UFMA/EBSERH. https://orcid.org/0000-0001-7219-5052

Roberta Ferreira Schaefer- Mestre em Enfermagem. Enfermeira assistencial no HU-UFJF/EBSERH. https://orcid.org/0000-0001-5624-8839

Cassia Evangelista Delgado – Mestranda em Enfermagem pela UFJF. https://orcid.org/0000-0001-5841-5434

RESUMO

A vacina contra Hepatite B é crucial para pacientes com insuficiência renal crônica, devido à vulnerabilidade à infecção. Pacientes em hemodiálise requerem monitoramento contínuo dos anticorpos Anti-HBs e da situação vacinal. Buscamos identificar a situação vacinal e a titulação do Anti-HBs através de um estudo transversal retrospectivo, realizado entre abril e julho de 2022, que avaliou 100 pacientes em hemodiálise. Observou-se paridade entre os sexos, com predomínio de pacientes acima de 55 anos, e tempo médio de hemodiálise de 2 a 5 anos. 95% dos pacientes já haviam recebido pelo menos um esquema completo de 4 doses da vacina, e 93% mantiveram níveis adequados de imunidade. Apesar da maioria dos participantes apresentarem imunidade, o acompanhamento semestral é crucial para garantir a manutenção da soroconversão. O papel do enfermeiro é fundamental no acompanhamento vacinal em Unidades de Hemodiálise, assegurando imunização adequada.

DESCRITORES: Insuficiência Renal Crônica; Diálise Renal. Imunização; Vacinas contra Hepatite B; Soroconversão.

ABSTRACT

The Hepatitis B vaccine is crucial for patients with chronic renal failure, due to their vulnerability to infection. Patients on hemodialysis require continuous monitoring of Anti-HBs antibodies and vaccination status. We sought to identify the vaccination status and Anti-HBs titration through a retrospective cross-sectional study, carried out between April and July 2022, which evaluated 100 patients on hemodialysis. There was parity between the sexes, with a predominance of patients over 55 years old, and an average time of hemodialysis of 2 to 5 years. 95% of the patients had already received at least one complete schedule of 4 doses of the vaccine, and 93% maintained adequate levels of immunity. Although most participants had immunity, biannual monitoring is crucial to ensure the maintenance of seroconversion. The role of the nurse is fundamental in vaccination monitoring in Hemodialysis Units, ensuring adequate immunization.

KEYWORDS: Chronic Renal Failure; Renal Dialysis. Immunization; Hepatitis B Vaccines; Seroconversion.

RESUMEN

La vacuna contra la Hepatitis B es crucial para los pacientes con insuficiencia renal crónica, debido a su vulnerabilidad a la infección. Los pacientes en hemodiálisis requieren un seguimiento continuo de los anticuerpos anti-HBs y del estado de vacunación. Se buscó identificar el estado de vacunación y el título de Anti-HBs a través de un estudio transversal retrospectivo, realizado entre abril y julio de 2022, que evaluó a 100 pacientes en hemodiálisis. Se observó paridad entre sexos, con predominio de pacientes mayores de 55 años y una duración promedio de la hemodiálisis de 2 a 5 años. El 95% de los pacientes ya había recibido al menos un ciclo completo de 4 dosis de la vacuna y el 93% mantenía niveles adecuados de inmunidad. Aunque la mayoría de los participantes tienen inmunidad, el seguimiento semestral es crucial para garantizar que se mantenga la seroconversión. El papel de la enfermera es fundamental en el seguimiento de la vacunación en las Unidades de Hemodiálisis, asegurando una adecuada inmunización.

DESCRIPTORES: Insuficiencia Renal Crónica; Diálisis Renal. Inmunización; Vacunas contra la hepatitis B; Seroconversión.

Recebido: 02/12/2024 Aprovado: 13/12/2024

Tipo de artigo: Artigo Original

INTRODUÇÃO

A doença renal crônica (DRC) é atualmente considerada um problema de saúde pública mundial, tendo em vista sua alta prevalência e incidência na população em geral 1. No Brasil, o prognóstico da doença ainda é ruim e os custos com o tratamento são elevados, além de um diagnóstico tardio, que pode levar a complicações sistêmicas graves 1-3

A DRC é definida pela presença de lesão renal permanente, ocorrendo perda funcional de forma lenta e progressiva, geralmente irreversível, e é avaliada pelo nível de filtração glomerular (FG), que sofre diminuição de acordo com o avanço da doença. Essa perda, por ser lenta e progressiva, dificulta o diagnóstico da doença, uma vez que o indivíduo pode permanecer por longos períodos totalmente assintomático, ou apresentar sintomas inespecíficos, que contribuirão para o retardo na detecção 4,5.

O tratamento da DRC depende da progressão da doença, podendo ser do tipo conservador, com utilização de terapia medicamentosa e acompanhamento nutricional, ou  a terapia renal substitutiva (TRS), sendo elas a hemodiálise (HD), diálise peritoneal e o transplante renal, responsáveis por ofertar maior sobrevida aos pacientes quando este atinge o último estágio da DRC 6.

De acordo com o Censo 2022, realizado pela Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), do número total de pacientes em diálise no Brasil, 95,3% são submetidos à hemodiálise, sendo uma importante modalidade de tratamento 7,8.

Pacientes submetidos à hemodiálise normalmente apresentam imunossupressão, sendo considerado um grupo de risco elevado para Hepatite B, uma vez que essa condição de saúde pode interferir na manutenção de anticorpos vacinais Anti-HBs 9. Justificam-se, portanto, medidas de base epidemiológica que tenham como meta impedir que a TRS se transforme em um agente incontrolável de morbidade e mortalidade por infecções potencialmente preveníveis 10.

Nesse sentido, a vacinação é um método seguro e eficaz para a prevenção da Hepatite B, além de apresentar baixo custo e ser amplamente disponibilizado para a população em geral 11. Os pacientes com DRC  pertencem ao grupo considerado de risco para a aquisição da infecção pelo vírus da Hepatite B (VHB), de acordo com a recomendação do Centro de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIE) e da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), por isso realizam um esquema de vacinação reforçado, com administração de 4 doses utilizando o dobro da dose convencional (2 ml por dose), nos intervalos de 0, 1, 2 e 6 meses. Ainda nos casos em que ocorrem declínio de títulos de Anti-HBs vacinal para níveis não protetores (< 10 mUI/mL), os pacientes em hemodiálise devem receber novas doses de reforço da vacina 12,13.

O Programa Nacional de Imunização (PNI) recomenda e oferece gratuitamente a vacina contra Hepatite B para os hemodialisados desde o início da década de 1990.  Em 1996, com a publicação da Portaria nº 2.042, essa vacina tornou-se obrigatória para todos os usuários que convivem com DRC em tratamento hemodialítico, sendo essa normatização ratificada pela Resolução Colegiada (RDC) nº 154, de 15 de junho de 2004 14,15.

Apesar desses normativos indicarem a obrigatoriedade de verificação da situação vacinal e imunidade para Hepatite B, autores afirmam que não existem estudos sobre a real aplicação dessas normativas em centros de hemodiálise no Brasil. Acrescentam ainda, uma notória carência de estudos sobre monitoramento de títulos protetores de Anti-HBs vacinal em hemodialisados 16.

Pesquisas apontam que existem poucas informações sobre a situação vacinal dos renais crônicos em hemodiálise 1,17. Diante do exposto, percebemos a importância da realização desse estudo para conhecimento da realidade local no que tange à situação vacinal contra Hepatite B dos pacientes em hemodiálise em um serviço de referência no município de Juiz de Fora. 

Assim, o objetivo desse estudo foi verificar a situação vacinal contra Hepatite B em indivíduos que realizam hemodiálise no Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora HU/UFJF, bem como sua titulação de anticorpos Anti-HBs, que conferem imunidade contra a doença. 

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo transversal, com coleta de dados retrospectivos. A amostra inicial para o estudo era composta por 129 pacientes renais crônicos admitidos no Programa, porém foram delimitados os critérios de inclusão apenas os pacientes maiores de 18 anos, e com pelo menos um ano em tratamento hemodialítico no Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora (HU/UFJF). 

Esse serviço atende a pacientes provenientes do município de Juiz de Fora e de outras cidades da região, diluídos entre 6 turnos de funcionamento com pacientes distintos, realizando diálise nas segundas/ quartas/ sextas, ou nas terças/ quintas/ sábados, variando o tempo de cada sessão em média de 3 a 4 horas. O serviço funciona de 06 horas até 22 horas, sendo que o primeiro turno é de 06h-12:15h; o segundo turno de 11h-17:15h, e o terceiro turno de 15:45h-22h.

 A população final analisada, após critérios de exclusão, foi de 100 pacientes, sendo que 28 pacientes não realizavam diálise há pelo menos um ano no local do estudo, e 01 veio a óbito durante a fase de coleta de dados.

Os dados foram coletados no período de abril a julho de 2022, nos prontuários físicos dos referidos pacientes, os quais contém um impresso específico do serviço para registro e acompanhamento de vacinas do paciente, no que tange às datas das doses do imunobiológico contra Hepatite B administradas. Para verificar a imunidade adquirida, utilizamos o resultados da titulação dos valores de Anti-HBs, que estão disponíveis nos prontuários online dos pacientes no Aplicativo de Gestão para Hospitais Universitários – AGHU, que é um sistema de gestão hospitalar, com foco no paciente, adotado como padrão para todos os hospitais universitários federais da rede EBSERH. Também foram coletados dados sociodemográficos como idade (em anos), gênero (feminino e masculino), tempo de hemodiálise (em meses), e condições crônicas, como Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e Diabetes Mellitus (DM). 

Os dados foram coletados e organizados através de criação de banco de dados no programa estatístico Statistical Package for Social Sciences- SPSS, e posteriormente analisados de acordo com as características de cada variável.

O presente estudo teve aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário da UFJF, parecer nº 5.277.684, com nº de Certificado de Apresentação para Apreciação Ética – CAAE 55487022.7.0000.5133. 

RESULTADOS

Na amostra de 100 pacientes, foi realizada a caracterização da população estudada por meio da distribuição das frequências por sexo, faixa etária, tempo de realização de HD no local de estudo, condição de portador de HAS e/ou DM. Os dados referentes à caracterização sociodemográfica dos participantes do estudo são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1: Características sociodemográficas dos participantes do estudo.

Variável

Classe

N

%

Sexo

Feminino

Masculino

50

50

50

50

Faixa Etária

(anos)

Abaixo de 45 anos

De 45 a 54 anos

De 55 a 64 anos

Acima de 65 anos

16

18

27

39

16

18

27

39

Tempo de HD na Instituição (meses)

12 a 24 meses

25 a 60 meses

61 meses ou mais

19

54

27

19

54

27

Patologia crônica associada

HAS

DM

HAS + DM

Nenhuma patologia

52

0

47

1

52

0

47

1

 

Fonte: Dados da pesquisa.

Em relação a situação do esquema vacinal contra Hepatite B, referente ao registro de doses administradas, identificamos através dos prontuários que 95% (n=95) dos pacientes, apresentava registro do primeiro esquema de vacinação completo, ou seja, quatro doses de 2ml nos intervalos de 0, 1, 2 e 6 meses. Identificamos que 5% (n=5) dos participantes do estudo não apresentavam registro referente a vacinação contra Hepatite B, porém no prontuário físico constavam registro de que os pacientes haviam perdido o cartão de vacina. 

Nos casos em que não havia registro de vacinação contra o vírus, foi verificado o resultado do Anti-HBs, sendo que os cinco pacientes tiveram resultado positivo, sinalizando imunidade e por isso não sendo necessário, no momento, a administração de novas doses.

Um total de 40% dos pacientes apresentaram, em algum momento do seu tratamento, valores de Anti-HBs inferiores ao preconizado, e por isso fez-se necessária a repetição do esquema vacinal com mais quatro doses do imunobiológico. Dentre esses indivíduos, 36 estavam com o segundo esquema vacinal completo no momento da coleta dos dados da pesquisa, enquanto 4 usuários precisavam de agendamento para completar o esquema de doses. Durante o período de levantamento dos dados, foi realizada a coleta de amostras para titulação do Anti-HBs conforme preconizado pelo protocolo do serviço 18. A Figura 1 apresenta o gráfico com os valores dos resultados do Anti-HBs do mês de julho de 2022.

Figura 1- Gráfico com os valores de Anti-HBs (UI/mL) de julho de 2022, e condutas para administração de novas doses.

Fonte: Dados da pesquisa.

A partir dos resultados do Anti-HBs identificamos que 93 usuários estavam imunizados, enquanto 3 necessitavam de uma dose de reforço e 4 precisavam completar o esquema de quatro doses. 

Considerando os pacientes imunes, 63 deles foram bons respondedores, apresentando valores de Anti-HBs acima de 100 UI/ml, e 30 apresentaram valores entre 10 e 100 UI/ml, não sendo necessárias realizar novas doses de vacina. Nos 7 pacientes que apresentaram Anti-HBs abaixo de 10 UI/ml, com a recomendação de completar o segundo esquema ou de realizar dose de reforço, de acordo com última dose administrada, foram realizadas administrações das doses ou programação de datas para administração das mesmas pelos enfermeiros da Unidade, após contato com a Unidade do CRIE local para envio das doses a serem administradas.

DISCUSSÃO

Os pacientes do presente estudo não tiveram predominância de sexo, sendo observadas a proporção de metade dos participantes do sexo masculino e metade do sexo feminino. Alguns estudos, porém, realizados com diferentes populações, sejam pacientes adultos ou pediátricos, seguindo tanto o tratamento dialítico quanto o conservador, apontam o sexo masculino e os portadores de nefropatias como os grupos com maior prevalência na DRC. Os últimos Censos Brasileiros de Diálise também apontam para essa prevalência do sexo masculino entre os portadores de DRC em tratamento hemodialítico 8,16,19,20.

Com relação à faixa etária, em nosso estudo foram avaliados os pacientes adultos, acima de 18 anos, que estivessem em diálise há pelo menos um ano no serviço na data de início da coleta de dados. A idade dos pacientes variou de 25 a 93 anos, sendo que a maior parte dos pacientes se concentrou na faixa etária acima de 65 anos, representando 39% dos participantes. Realizando a comparação com outros estudos identificamos diferenças entre as idades predominantes entre participantes, sendo a maioria na faixa etária entre 45 e 60 anos 21,22. No entanto, esses achados corroboram com a perspectiva de que o aumento da idade está diretamente relacionado ao desenvolvimento de DRC devido às alterações no sistema renal provocadas pelo avançar da idade 23. Além disso, pesquisas referem que a idade, na população adulta, é um dos fatores não modificáveis que interferem na soroconversão, dessa forma, quanto mais avançada for a idade, pior será a resposta vacinal 20,24.

O aumento crescente da população com DRC atribui-se principalmente ao envelhecimento da população em geral, além do aumento da prevalência de doenças crônicas, como HAS e DM 25,26. No presente estudo não foram avaliadas as doenças de base dos participantes, porém dados com relação ao atual diagnóstico de HAS e DM foram julgados importantes para essa coleta, uma vez que a presença de ambas as patologias pode influenciar, direta ou indiretamente, na resposta vacinal e contribuir para um risco maior de infecção pelo VHB 27.

Um estudo realizado na mesma região contemplando o serviço de HD de um hospital universitário e duas clínicas privadas conveniadas ao SUS, avaliou a adesão ao regime terapêutico de pacientes em hemodiálise e os fatores associados, demonstrando que o tempo médio de realização de HD pelos pacientes incluídos no estudo foi de 54,19 meses, o que corresponde a aproximadamente 4 anos e meio de tratamento 28. Em nosso estudo identificamos que a maioria dos pacientes (54%) realizam HD na instituição entre 25 a 60 meses, que corresponde a realização do tratamento por 2,1 a 5 anos. Ambos os estudos demonstraram que os pacientes realizam tratamento por um período prolongado, indicando uma consistência geral na duração do tratamento entre os usuários da região. 

Quanto à sobrevida dos pacientes, após um ano de tratamento hemodialítico, estudo apontou que girava em torno de 80%, e após 5 anos de tratamento, de aproximadamente 64%, para pacientes com menos de 50 anos de idade e não portadores de DM, correlacionado os principais fatores de risco que influenciavam na mortalidade, sendo  eles: a idade avançada e a ocorrência de diabetes mellitus 29.

Pacientes hipertensos e diabéticos, de um modo geral, possuem maior chance de se tornarem renais crônicos, assim como, sendo um importante fator de risco, o diabetes pode aumentar o risco de um paciente em contrair Hepatite B 1. Pacientes com valores altos frequentes de glicemia podem convergir para não soroconversão, mesmo após vacinação 30, sendo então um tópico importante para avaliarmos a prevalência na nossa população de estudo. 

Acerca dos usuários que possuem HAS ou DM, observou-se que 52% dos pacientes são portadores de HAS, enquanto que 47% são portadores de HAS e DM. Durante o tratamento hemodialítico e com o decorrer dos anos, muitos pacientes, inicialmente sem tais diagnósticos, podem desenvolver essas patologias, sobretudo devido ao processo de lesão renal progressiva desencadeando um comprometimento multisistêmico do organismo 31. Tais valores de prevalência dessas comorbidades nos participantes do estudo desenvolvido são semelhantes ao que está descrito na literatura, que aponta que a HAS é a etiologia mais prevalente entre os pacientes com IRC seguida da DM 32.

Quando se trata da população de hemodialisados, esse grupo específico necessita de um olhar diferenciado nas questões do histórico vacinal voltado contra a Hepatite B, uma vez que o conhecimento da situação vacinal deve ser prioritário. Ainda, para esse grupo, é recomendado a monitoração dos títulos de Anti-HBs vacinal, bem como doses de reforço da vacina 13. 

Propõem-se como ideal um nível de Anti-HBs ≥ 100 UI/ml nos pacientes com DRC pelo fato da soroproteção ser mais duradoura nesses pacientes 33. Se os níveis estiverem abaixo de 10 UI/ml, recomenda-se dose de revacinação desses pacientes, uma vez que estão mais susceptíveis ao declínio dos níveis de anticorpos ao longo do tempo 15, 34.

Diante dessa informação, e para programação das doses a serem administradas, faz-necessário relacionar os valores de Anti-HBs, a situação vacinal do paciente, bem como a última dose de imunobiológico administrada, para então definir a conduta a ser definida para novas doses de reforço 18.

 As informações coletadas nos prontuários físicos dos pacientes referentes as doses e datas de administração dos imunobiológicos demonstraram que na maior parte dos prontuários (95%) constava a informação de registros de doses. Diferentemente de estudo similar realizado em Ribeirão Preto, em que foram constatados que apenas 39,2% possuíam esse tipo de registro sobre vacinação no prontuário de saúde 16. Tal achado demonstra que no serviço em questão, em que cada turno de hemodiálise tem um enfermeiro responsável pelo acompanhamento de registros e providências quanto a atualização vacinal, mostrou-se estratégia de grande eficácia para manutenção dos registros completos relacionados a situação vacinal dos usuários do serviço.

De acordo com a RDC nº 154 que estabelece sobre o regulamento técnico dos serviços de diálise, tanto a vacinação contra Hepatite B em hemodialisados, bem como o monitoramento dos níveis de Anti-HBs são obrigatórios 15. Autores apontam para a necessidade de monitorar esse Anti-HBs e controlar a situação vacinal, pois identificaram indivíduos não respondedores e que não foram encaminhados para administração de doses de reforço, sugerindo uma ausência de acompanhamento e necessidade de monitoramento amplo e completo dos pacientes de programas de hemodiálise 17. 

A mesma RDC aponta que todo serviço deve implantar e implementar um Programa de Controle e Prevenção de Infecção, e esse programa deve ser elaborado pelos profissionais do serviço de diálise sob a responsabilidade de um enfermeiro ou médico do serviço 15. Compete ao profissional enfermeiro o planejamento, organização, execução e a avaliação da assistência de enfermagem, que inclui controle e prevenção de infecções 15. Neste contexto, monitorar os pacientes em hemodiálise, considerando a situação de títulos do Anti-HBs vacinal, e garantir a vacinação dos pacientes suscetíveis ao HBV deveria ser uma competência natural desse profissional 35

Na presente investigação, a vigilância da resposta vacinal dos pacientes sob sua responsabilidade é realizada pelos profissionais enfermeiros de cada turno do Serviço de hemodiálise, e quando identificadas necessidades de novas doses, as mesmas são providenciadas e administradas. Porém, destaca-se e sinaliza-se a importância e necessidade de regulamentar um Grupo de Trabalho Permanente, envolvendo além dos profissionais da hemodiálise, funcionários do CRIE local, para padronização, acompanhamento e administração das doses de vacinas pendentes, além de treinamentos, atualizações sobre o tema e constante reforço sobre a importância desse acompanhamento para melhorar a adesão às práticas de vacinação, além do estabelecimento de ações efetivas para abranger a saúde e qualidade de vida do paciente renal crônico 36.

Por tratar-se de um estudo transversal com coleta de dados retrospectivos, o mesmo apresenta algumas limitações, podendo destacar que a população avaliada pelo estudo é específica de um serviço de HD, podendo não representar de forma significativa a população de pacientes RC em HD. Além disso, esse estudo não permite estabelecimento de relação de causalidade, da mesma forma que por se tratar de um estudo retrospectivo, as informações registradas no prontuário podem não refletir as condições atuais, limitando a aplicabilidade dos resultados a contextos recentes.

CONCLUSÃO

Os resultados do estudo demonstram que a monitorização e acompanhamento dos valores de Anti-HBs realizada pelos enfermeiros do serviço de Diálise é de extrema relevância para o acompanhamento do processo de soroconversão dos pacientes que necessitam da terapia renal substitutiva. Ao identificar a necessidade de novas doses, é feito contato com o CRIE local para envio das doses a serem administradas no próprio serviço, garantindo assim o cumprimento do esquema vacinal e favorecendo a qualidade de vida do indivíduo. Destaca-se que, assim como outros estudos sinalizam, é fundamental que nos Serviços de Diálise tenham equipes específicas para esse monitoramento e acompanhamento da situação vacinal e soroconversão para controle e prevenção da infecção por Hepatite B nesses serviços.

No Brasil, ainda há carência de estudos sobre o monitoramento de títulos protetores de Anti-HBs vacinal em hemodialisados, sendo assim, sinaliza-se que essa temática poderia ser investigada por outras pesquisas e assim contribuir para ampliar os debates sobre essa questão tão relevante nesse contexto.

Os resultados deste estudo contribuíram para o compartilhamento de conhecimentos entre os profissionais, e também para a elucidação da situação vacinal e necessidade de intervenções assistenciais e educacionais relacionadas à imunização contra a Hepatite B, contribuindo para direciona a atenção para essas questões nos serviços de diálise, melhorando a qualidade da assistência à saúde no serviço.  Além disso, subsidia o planejamento e os cuidados de enfermagem baseados em evidências, ajudando na prevenção da Hepatite B e melhorando a qualidade de vida dos pacientes.

REFERÊNCIAS 

  1. Cotrim TS, Reis PV, Fonseca DC, De Souza APR, De Oliveira KB, Aguiar JS, et al. Fatores de risco associados à soroconversão após vacinação contra Hepatite B em pacientes com doença renal crônica em hemodiálise. Acervo Saúde 2021;13:e4934. Disponível em: https://doi.org/10.25248/reas.e4934.2021
  2. Silva PAB, Silva LB, Santos JFG, Soares SM. Brazilian public policy for chronic kidney disease prevention: challenges and perspectives. Rev Saúde Pública 2020;54:86. Disponível em: https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2020054001708
  3. Fermi MRV. Diálise para enfermagem: Guia prático. 2a. Editora Guanabara Koogan Ltda; 2010.
  4. Santos BPD, Oliveira VA, Soares MC, Schwartz E. Doença renal crônica: relação dos pacientes com a hemodiálise. ABCS Health Sci 2017;42(1): 8-14. Disponível em: https://doi.org/10.7322/abcshs.v42i1.943.
  5. Cheever KH, Hinkle JL. Brunner & Suddarth: Tratado de enfermagem médico-cirúrgica. 14a. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan Ltda; 2020.
  6. Alvares J, Almeida AM, Szuster DAC, Gomes IC, Andrade EIG, Acurcio FDA, et al. Fatores associados à qualidade de vida de pacientes em terapia renal substitutiva no Brasil. Ciênc Saúde Coletiva 2013;18:1903–10. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232013000700
  7. Sociedade Brasileira de Nefrologia. Censo de Diálise; 2022. Available from: https://www.censo-sbn.org.br/censosAnteriores
  8. Nerbass FB, Lima HDN, Moura-Neto JA, Lugon JR, Sesso R. Censo Brasileiro de Diálise 2022. Braz J Nephrol 2024;46:e20230062. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2175-8239-jbn-2023-0062pt.
  9. Costa NCPD, Canhestro MR, Soares CMBM, Rodrigues JS. Monitoring of post-vaccination anti-HBs titles vaccine in children and adolescents in the pre-dialysis of chronic kidney disease. Braz J Nephrol 2017;39(3):296-304. Disponível em: https://doi.org/10.5935/0101-2800.20170044. 
  10. Garcia-Garcia G, Jha V. Chronic kidney disease in disadvantaged populations. Braz J Med Biol Res 2015;48(5):377–81. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1414-431X20144519
  11. Center for Disease Control (CDC). Guidelines for Vaccinating Kidney Dialysis Patients and Patients with Chronic Kidney Disease summarized from Recommendations of the Advisory Committee on Immunization Practices (ACIP). [Internet]. 2012. Reviewed 2015. 1-12. Disponível em: http://www.cdc.gov/vaccines/pubs/downloads/dialysis-guide-2012.pdf
  12. Brasil. Ministério da Saúde. Manual dos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis, Coordenação-Geral do Programa Nacional de Imunizações. 5. ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2019. 174 p. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_centros_imunobiologicos_especiais_5ed.pdf
  13. Sociedade Brasileira de Imunizações. Calendários de vacinação SBIm pacientes especiais 2022-2023. [Internet]. 2022. Disponível em: https://sbim.org.br/images/calendarios/calend-sbim-pacientes-especiais.pdf
  14. Brasil. Portaria 2042, de 11 de outubro de 1996. Estabelece o Regulamento Técnico para o funcionamento dos Serviços de Terapia Renal Substitutiva e as normas para cadastramento desses estabelecimentos junto ao Sistema Único de Saúde. Brasília, 1996.
  15. Brasil. Resolução RDC nº 154, de 15 de junho de 2004. Estabelece o Regulamento Técnico para o funcionamento dos serviços de diálise. Brasília, 2004.
  16. Lopes LP, Teles SA, Romão EA, Toffano SEM, Rocha DFN de C, Gir E. Vacinação contra Hepatite B em indivíduos renais crônicos em tratamento hemodialítico. Rev enferm UERJ 2014; 22(3):309-13. Disponível em: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lil-748599
  17. Sobrinho EMM, Teles SA. Situação vacinal contra a hepatite em pacientes renais crônicos em Goiânia-GO. Virus reviews and research 2015; 14(1):3 112-119. Disponível em: http://www.sbpcnet.org.br/livro/63ra/conpeex/pibic/trabalhos/EVERALDO.PDF.
  18. Marassi, AL. Protocolo de sorologias virais em hemodiálise - Rotina de vacinação para hepatite B. Juiz de Fora- MG, 21 de setembro de 2020.
  19. Taheri S, Shahidi S, Moghtaderi J, Seirafian S, Emami A, Eftekhari SM. Response Rate to Hepatitis B Vaccination in Patients with Chronic Renal Failure and End-Stage-Renal-Disease: Influence of Diabetes Mellitus. Journal of Research in Medical Sciences 2005;10:384–90. Disponível em: http://jrms.mui.ac.ir/index.php/jrms/article/view/42.
  20. DaRoza G, Loewen A, Djurdjev O, Love J, Kempston C, Burnett S, et al. Stage of chronic kidney disease predicts seroconversion after hepatitis B immunization: earlier is better. Am J Kidney Dis 2003;42(6):1184–92. Disponível em: https://doi.org/10.1053/j.ajkd.2003.08.019.
  21. Campos AR, Costa RV, França KL de A, Silva DB, Resende PPT, Miranda MF. Perfil clínico e epidemiológico dos pacientes com doença renal crônica submetidos a hemodiálise em São João Del Rei – MG. Braz J Dev 2020;6:97016–32. Disponível em: https://doi.org/10.34117/bjdv6n12-263.
  22. Santos LDJM, Ferreira TCA, Pereira Junior JR, Rodrigues YC, Ferreira FSDS, Araújo CNDS, et al. Perfil clínico-epidemiológico dos pacientes atendidos no centro de hemodiálise de Pinheiro no estado do Maranhão. Res Soc Dev 2024;13:e11213445616. Disponível em: https://doi.org/10.33448/rsd-v13i4.45616
  23. Aguiar LKD, Prado RR, Gazzinelli A, Malta DC. Fatores associados à doença renal crônica: inquérito epidemiológico da Pesquisa Nacional de Saúde. Rev Bras Epidemiol 2020;23:e200044. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-549720200044.
  24. Chin AI. Hepatitis B virus vaccine response in hemodialysis: baseline patient characteristics. Hemodial Int 2003;7:296-303. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1046/j.1492-7535.2003.00053.x
  25. Liu Y, He Q, Li Q, Tian M, Li X, Yao X, et al. Global incidence and death estimates of chronic kidney disease due to hypertension from 1990 to 2019, an ecological analysis of the global burden of diseases 2019 study. BMC Nefrologia 2023;24:352. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s12882-023-03391-z
  26. Wei H, Ren J, Li R, Qi X, Yang F, Li Q. Global, regional, and national burden of chronic kidney disease attributable to high fasting plasma glucose from 1990 to 2019: a systematic analysis from the global burden of disease study 2019. Endocrinol frontal 2024;15. Disponível em: https://doi.org/10.3389/fendo.2024.1379634
  27. Junior JER. Doença Renal Crônica: Definição, Epidemiologia e Classificação. J Bras Nefrol 2004;26(3 suppl. 1):1–3. Disponível em: https://www.bjnephrology.org/article/doenca-renal-cronica-definicao-epidemiologia-e-classificacao/
  28. Pereira CV, Leite ICG. Fatores associados à não adesão ao regime terapêutico de pacientes em hemodiálise. Cad saúde colet 2022;30(3):349–60. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1414-462X202230030012
  29. Sesso RC, Lopes AA, Thomé FS, Lugon JR, Martins CT. Brazilian Chronic Dialysis Survey 2016. J Bras Nefrol 2017;39(3):261–6. Disponível em: https://doi.org/10.5935/0101-2800.20170049
  30. Körber N, Pohl L, Weinberger B, Grubeck-Loebenstein B, Wawer A, Knolle PA, et al. Hepatitis B Vaccine Non-Responders Show Higher Frequencies of CD24highCD38high Regulatory B Cells and Lower Levels of IL-10 Expression Compared to Responders. Front Immunol 2021;12. Disponível em: https://doi.org/10.3389/fimmu.2021.713351
  31. Bello AK, Alrukhaimi M, Ashuntantang GE, Basnet S, Rotter RC, Douthat WG, et al. Complications of chronic kidney disease: current state, knowledge gaps, and strategy for action. Kidney International Supplements 2017;7(2):122–9. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.kisu.2017.07.007
  32. Nerbass FB, Lima H do N, Lugon JR, Sesso R. Hemodiálise no Brasil: diferenças entre regiões geográficas quanto a dados demográficos, parâmetros laboratoriais e prescrição de medicamentos. Braz J Nephrol 2023;45(4):410–6. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2175-8239-JBN-2022-0169pt
  33. Schillie S. Prevention of Hepatitis B Virus Infection in the United States: Recommendations of the Advisory Committee on Immunization Practices. MMWR Recomm Rep 2018;67(1):1–31. Disponível em: https://doi.org/10.15585/mmwr.rr6701a1
  34. Chaves SS, Daniels D, Cooper BW, Malo-Schlegel S, MacArthur S, Robbins KC, et al. Immunogenicity of hepatitis B vaccine among hemodialysis patients: Effect of revaccination of non-responders and duration of protection. Vaccine 2011;29:9618–23. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/j.vaccine.2011.10.057
  35. Lin S-Y, Liu J-H, Wang S-M, Wang I-K, Tsai C-A, Liu Y, et al. Association of response to hepatitis B vaccination and survival in dialysis patients. BMC Nephrology 2012;13:97. Disponível em: https://doi.org/10.1186/1471-2369-13-97
  36. Gebrie MH, Asfaw HM, Bilchut WH, Lindgren H, Wettergren L. Health-related quality of life among patients with end-stage renal disease undergoing hemodialysis in Ethiopia: a cross-sectional survey. Health and Quality of Life Outcomes 2023;21:36. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s12955-023-02117-x