AÇÕES DE ENFERMAGEM PARA PREVENÇÃO DO HIV EM ADOLESCENTES: UMA REVISÃO INTEGRATIVA
AÇÕES DE ENFERMAGEM PARA PREVENÇÃO DO HIV EM ADOLESCENTES: UMA REVISÃO INTEGRATIVA
NURSING ACTIONS FOR HIV PREVENTION IN ADOLESCENTS: AN INTEGRATIVE REVIEW
ACCIONES DE ENFERMERÍA PARA LA PREVENCIÓN DEL VIH EN ADOLESCENTES: UNA REVISIÓN INTEGRATIVA
Camila Harmuch, Doutoranda em Enfermagem pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). http://lattes.cnpq.br/7812761481645789.
Anny Caroline Ribeiro Devechi, Mestranda em Enfermagem pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). http://lattes.cnpq.br/3207228506217155.
Mateus Miranda Fernandes de Faria, Mestrando em Enfermagem pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). http://lattes.cnpq.br/4633121976660675.
Jéssica dos Santos Pini, Doutoranda em Enfermagem pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). http://lattes.cnpq.br/9667642451135942.
Paula Antunes Bezerra Nacamura, Doutoranda em Enfermagem pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). http://lattes.cnpq.br/6492485263602960.
Marcelle Paiano, Doutora em Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá (UEM). http://lattes.cnpq.br/4789507500516133.
André Estevam Jaques, Doutor em Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá (UEM). http://lattes.cnpq.br/7940798225422360.
Autor correspondente: Vinícius Brito de Souza, Mestrando em Enfermagem pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), Maringá-PR, E-mail: vinibritoEnf@hotmail.com http://lattes.cnpq.br/6954928002828757.
RESUMO
Objetivo: identificar como os enfermeiros desenvolvem a prevenção do HIV em adolescentes. Método: trata-se de uma revisão integrativa de literatura, por meio de estudos selecionados em bases eletrônicas: Science Direct, PubMed, Web of Science, Scopus e Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE), a busca dos estudos foi realizada nos meses de outubro a novembro de 2022. Resultados: Foram selecionados quatro artigos, sendo todos publicados em periódicos internacionais. Conclusão: Conclui-se que o estudo apontou os facilitadores e as dificuldades em profissionais da enfermagem ao realizar cuidados preventivos de HIV junto a adolescentes.
DESCRITORES: Infecções por HIV; Enfermagem; Controle de Infecções; Adolescente; Pesquisa Qualitativa.
ABSTRACT
Objective: to identify how nurses develop HIV prevention in adolescents. Method: this is an integrative literature review, through selected studies in electronic databases: Science Direct, PubMed, Web of Science, Scopus and Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE), the search for studies was carried out in the October to November 2022. Results: Four articles were selected, all of which were published in international journals. Conclusion: It is concluded that the study pointed out the facilitators and difficulties for nursing professionals when performing HIV preventive care with adolescents.
RESUMEN
Objetivo: identificar cómo los enfermeros desarrollan la prevención del VIH en adolescentes. Método: se trata de una revisión integrativa de la literatura, a través de estudios seleccionados en bases de datos electrónicas: Science Direct, PubMed, Web of Science, Scopus y Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE), la búsqueda de estudios se realizó en los meses de octubre a noviembre. 2022. Resultados: Se seleccionaron cuatro artículos, todos publicados en revistas internacionales. Conclusión: Se concluye que el estudio apuntó facilitadores y dificultades para los profesionales de enfermería en la realización de cuidados preventivos del VIH con adolescentes.
Recebido: 17/03/2023
Aprovado: 10/04/2023
INTRODUÇÃO
Os adolescentes são considerados um grupo vulnerável, por terem dificuldades de assumir decisões maduras sobre suas vidas e por adotarem comportamentos de risco, estando expostos a diferentes ameaças à saúde1. Dentre estas ameaças, vale ressaltar que as Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), consistem em um problema de saúde pública que atinge principalmente os adolescentes, pois estes estão passando por momentos de descobertas e iniciação sexual, praticando sexo desprotegido e ficando mais vulneráveis a contrair doenças2.
A infecção de novos casos ocasionados pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) entre adolescentes vem aumentando ao longo dos anos. Em 2018, cerca de 21% dos novos casos de HIV registrados no Brasil ocorreram em adolescentes, com predominância no sexo masculino, faixa etária entre 13 e 19 anos e via de transmissão a sexual3.
É preciso que os serviços de saúde desenvolvam nos adolescentes a capacidade de reconhecer os riscos que possuem para contrair o HIV e a ciência das estratégias de prevenção disponíveis4. Além disso, as ações de promoção a saúde de adolescentes deve ser ampla e envolver, além da prevenção de comportamentos de risco e infecção por IST e HIV, a qualidade de vida, a satisfação pessoal, a construção de competências sociais, o acolhimento contra a violência, o acesso as necessidades básicas de vida como saúde, educação, lazer, dentre outros5.
No Brasil, apesar de existirem políticas públicas destinadas a esta população, as ações em saúde são fragmentadas, baseadas em um modelo biomédico que não consideram as dimensões biopsicossociais e espirituais dos adolescentes, sendo pouco direcionada as suas singularidades6.
Dentre os profissionais da saúde, o enfermeiro desempenha papel fundamental na prevenção, adesão ao tratamento e no apoio à pessoa vivendo com HIV por meio das ações de prevenção, visitas domiciliares, cuidados assistenciais e atividades de promoção à saúde. Especificamente para os adolescentes, o enfermeiro precisa desenvolver ações que contemplem a prevenção deste agravo, considerando as características e particularidades desse público7.
Para além disso, a enfermagem deve fazer uso das políticas públicas, de ferramentas e estratégias para melhorar a qualidade da assistência aos jovens, por meio de um olhar sensível para esta população. Portanto esse profissional precisa estar atento e capacitado para lidar com as adversidades que poderão surgir ao abordar esta temática. Devido à importância e complexidade deste tema, o presente estudo tem por objetivo identificar como os enfermeiros desenvolvem a prevenção do HIV em adolescentes.
MÉTODOS
A pesquisa trata-se de uma revisão integrativa de literatura desenvolvida em cinco etapas distintas: 1) formulação e identificação do problema, buscando garantir a definição de propósitos na coleta de dados; 2) busca na literatura de forma estratégica; 3) avaliação dos dados, procurando a qualidade metodológica e o valor das informações nos artigos; 4) análise dos dados, incluindo a forma de expressão, paridade e conclusões dos dados; e 5) apresentação dos resultados, a qual sintetiza as descobertas e as suas implicações para a pesquisa e prática8.
Para a produção da questão norteadora da pesquisa, utilizou-se a estratégia PICo9 a qual permite e facilita a definição de quais referências são as mais necessárias para a resolução da questão de pesquisa. Assim, considerou-se a seguinte estrutura: P – Enfermeiros; I – Prevenção do HIV; Co – Adolescentes. Desta forma elaborou-se a seguinte questão: Como os enfermeiros desenvolvem a prevenção do HIV em adolescentes?
Os critérios de inclusão foram: artigos primários, disponíveis na integra, publicados nos últimos cinco anos, sem restrições no idioma, que abordem a temática proposta. Os critérios de exclusão foram: artigos secundários, como os de opinião, cartas ao editor, comunicações breves, editoriais; teses e dissertações; artigos que estavam duplicados nas bases de busca; e os que não respondiam à questão da pesquisa.
A busca dos estudos foi realizada nos meses de outubro a novembro de 2022 pelo portal de periódicos da capes, com acesso por meio da Comunidade Acadêmica Federada (CAFe). Os estudos foram selecionados nas seguintes bases de dados eletrônicas: Science Direct, PubMed, Web of Science, Scopus e Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE).
Para categorizar o nível de evidência dos estudos, considerou-se a seguinte classificação: nível I: metanálise de estudos controlados e randomizados, nível II: estudo experimental, nível III: estudo quase experimental, nível IV: estudo descritivo/não experimental ou com abordagem qualitativa, nível V: relato de caso ou experiência, nível VI: consenso e opinião de especialista10.
Para realizar a busca nas bases de dados, foram selecionados descritores disponíveis no Descritores em Ciências da Saúde (DeCs) e os correspondentes em inglês no Medical Subject Headings (MeSH), igualmente com os descritores não controlados. Estes foram associados aos operadores boleanos OR para distingui-los e AND para associá-los, os quais foram: HIV Infections AND nursing AND prevention control AND Adolescent AND qualitative research.
Para a seleção dos artigos foram estabelecidos critérios de inclusão e exclusão, a saber, critérios de inclusão: artigos disponibilizados gratuitamente e na integra, pertinentes ao objeto de estudo, publicados no período de 2018-2022, que fizessem referência inicialmente no seu título sobre a temática em estudo. Foram excluídos os duplicados e os achados não condizentes com o objetivo do estudo.
A partir das buscas foram identificados 723 estudos nas bases de dados, que foram submetidos às etapas de seleção, segundo as recomendações do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses11, representadas na Figura 2.
Decorrente ao processo metodológico, buscando maior qualidade dos resultados, foram realizadas leituras minuciosas nos resumos e artigos na integra, com implementação rigorosa dos critérios de seleção, de modo que quatro artigos foram selecionados para constituírem essa revisão.
Figura 2 Fluxograma de identificação do processo de seleção dos estudos incluídos na revisão integrativa. Brasil, 2020.
Foi realizada uma leitura analítica dos estudos, identificando os pontos-chaves para a hierarquização e síntese das ideias.
RESULTADOS
Foram selecionados quatro artigos, sendo todos publicados em periódicos internacionais. Destes, três (70%) foram identificados na Science Direct e dois (30%) na PubMed. No que tange ao desenho dos estudos, 70% são estudos qualitativos e 30% são estudos de métodos mistos. Quanto ao nível de evidência, todos os estudos incluídos foram classificados como nível IV (Quadro 2).
Quadro 2. Caracterização e categorização dos estudos. Brasil, 2020.
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Título |
Localização/ Periódico |
Objetivo/Tipo de estudo |
Desfecho |
Nível de Evidência |
E1 |
Youth-Serving Professionals’ Perspectives on HIV Prevention Tools and Strategies Appropriate for Adolescent Gay and Bisexual Males and Transgender Youth (CAHILL., 2020). |
Estados Unidos. J Pediatr Health Care |
Obter barreiras e facilitadores percebidos por profissionais que atendem jovens (profissionais de cuidados primários para adolescentes, enfermeiros, médicos, outros, enfermeiras escolares, trabalhadores juvenis e educadores) para fornecer educação, cuidados e serviços para reduzir o risco de HIV entre AMSM e jovens transgêneros. Estudo qualitativo. |
Os resultados destacam barreiras comuns e facilitadores para fornecer cuidados preventivos de HIV e educação para jovens nos grupos profissionais. Destaca-se a necessidade de desenvolver ferramentas de prevenção do HIV úteis em grupos profissionais, que incluam materiais educacionais on-line facilmente acessíveis, recursos de referência para conectar jovens com serviços focados e orientação para a implementação de políticas de saúde escolar baseadas em evidências para promover a saúde para jovens. |
IV |
E2 |
Nurses’ perceptions of adolescents accessing and utilizing sexual and reproductive healthcare services in Cape Town, South Africa: A qualitative study (JONAS et al., 2019). |
International Journal of Nursing Studies África do Sul |
Explorar os pontos de vista e as percepções das enfermeiras sobre as barreiras e necessidades de meninas adolescentes para acessar e utilizar serviços de saúde sexual e reproductiva. Estudo qualitativo |
Os fatores dos sistemas de saúde, como o horário de funcionamento da clínica, o espaço amigável para jovens e o programa de clínica para jovens desempenham um papel nos comportamentos irresponsáveis percebidos por meninas adolescentes e precisam ser abordados. É provável que as horas clínicas amigas do adolescente, juntamente com enfermeiras amigas da juventude, encorajem as adolescentes a acessar serviços de saúde sexual e reprodutiva e melhorar seu uso. |
IV |
E3 |
Nurses' Experiences Working With HIV Prevention: A Qualitative Study in Tanzania (ATHLEY; BINDER; MANGRIO, 2018). |
Tanzânia Journal of the Association of Nurses in AIDS Care |
Explorar as experiências dos enfermeiros no fornecimento de informações sobre a prevenção do HIV na Tanzânia. Estudo qualitativo |
Os resultados mostraram que os enfermeiros realizam o trabalho preventivo do HIV, dando informações, oferecendo aconselhamento e ensinando cuidados. Os enfermeiros enfrentaram muitos desafios: por exemplo, concepções erradas sobre o uso de preservativos, falta de informação das pessoas sobre o HIV, lidar com o estigma associado ao HIV e a falta de recursos no país. |
IV |
E4 |
The Essential Elements of Adolescent-friendly Care in School-based Health Centers: A Mixed Methods Study of the Perspectives of Nurse Practitioners and Adolescents (DALEY et al., 2019). |
Estados Unidos Journal of Pediatric Nursing.
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Identificar os elementos essenciais do cuidado amigo do adolescente a partir de especialista em enfermagem e adolescentes de centros de saúde escolares. Estudo de método misto. |
Os participantes destacaram a importancia das ações realizadas como ações sobre cuidados reprodutivos, disponibilidade de testes para DST, imunizações, cuidados de bem-estar, disponibilidade de medicamentos, exames e ações de educação em saúde. |
IV |
Fonte: autores, 2022.
Dentre os artigos que compuseram a revisão, 25% foram publicados em 2020, 50% em 2019 e 25% em 2018. Em relação a origem dos autores, 50% são dos Estados Unidos, 25% da África do Sul e 25% da Suécia. Todos os manuscritos foram publicados em revistas de enfermagem.
DISCUSSÃO
Estratégias realizadas por enfermeiros na prevenção do HIV em adolescentes
A prevenção em saúde é a principal ferramenta para o controle do HIV em adolescentes. As intervenções realizadas para este público, devem considerar a intersubjetividade dos sujeitos, ampliando o pensamento para as vulnerabilidades e demandas que permeiam esta população, permitindo assim, ampliar o leque de ações para se trabalhar16.
Os estudos encontrados(12, 13, 14, 15) demonstraram que o vínculo e a comunicação eficaz, aberta, honesta e confidencial é uma das principais estratégias dos enfermeiros para desenvolver a prevenção do HIV. A comunicação efetiva possibilita a construção de vínculo com o adolescente, que também é fortalecido pelas ações de promoção a saúde, investigação diagnóstica, apoio no tratamento e na reabilitação desenvolvidos pelo enfermeiro.
A comunicação adequada entre enfermeiros e usuários como ferramenta para garantir o seguimento da assistência à saúde e a efetividade da educação em saúde, contribui para que o adolescente tenha confiança e segurança na equipe. A comunicação, para ter bons resultados, precisa se voltar para a realidade do usuário e ser compreendida por eles17. Além disso, uma comunicação efetiva, fortalece o vínculo terapêutico permitindo que os indivíduos possam falar abertamente sobre suas dúvidas, temores e sintomas, servindo como estratégias de apoio profissional também no diagnóstico, tratamento do HIV e abordagem dos respectivos parceiros18.
Todos os estudos apontam, como uma importante estratégia de prevenção, os grupos de adolescentes realizados em escolas e instituições de saúde. A possibilidade de encaminhar os jovens para organizações locais, que possuem grupo de apoio para adolescentes, também é um benefício citado, mas que existe apenas em algumas comunidades(12, 13, 14, 15).
A realização de grupos para as ações educativas que envolvem a promoção da saúde e a prevenção de agravos é uma ferramenta de grande valia para a abordagem de diversos temas e públicos, pois alcançam maior número de pessoas, além de promover a troca de experiências19.
No Brasil, o Programa Saúde na Escola visa a realização de momentos com os escolares e se volta para a integralidade destes, sendo desenvolvido pelos serviços de saúde nas instituições de ensino. Para realizar ações de promoção a saúde, prevenção de agravos e assistência à saúde que gerem resultados positivos, considerando as vulnerabilidades deste público, é preciso boa articulação entre os setores e profissionais da saúde e da educação, bem como envolvimento de outros organismos existentes na comunidade20.
Neste contexto, em que a escola deveria ser um alicerce para a prevenção do HIV, o que se encontra são ações unidirecionais, que partem do campo da saúde para o campo da educação, e conteúdos que não dialogam ou cooperam para desenvolver cidadania e consciência, levando a atitudes que aumentam a vulnerabilidade dos adolescentes21.
Outro ponto levantado foi o uso de protocolos e diretrizes nacionais utilizados pelos enfermeiros no trabalho preventivo do HIV. O uso de documentos oficiais que indiquem os fluxos e procedimentos a serem seguidos facilita o desenvolvimento das ações de saúde e proporciona uma padronização em relação aos resultados que se espera. Essa gestão do cuidado e o manejo clínico adequado garantem que as melhores práticas sejam desenvolvidas22.
Contudo, pesquisa que avaliou o panorama das políticas de prevenção do HIV/AIDS no Brasil apontou a quase inexistência de documentos mais formalizados e abrangentes e a falta de um plano nacional de enfrentamento da epidemia abrangente ou voltado especificamente a determinados públicos, o que dificulta a identificação de ações de combate à epidemia e o seu controle social23.
A criação de ambientes inclusivos, o fornecimento de cuidados afirmativos, o encaminhamento de referência para outros serviços e o uso de políticas institucionais de apoio também foram citados como estratégias de enfermeiros nos estudos que compuseram essa revisão(12, 14).
Ao incorporar experiências prévias e pessoais nas ações educativas, o enfermeiro proporciona a discussão, ampliação e concretização do conhecimento científico, partindo do conhecimento popular. Com isto, pode-se confrontar a produção e reprodução do conhecimento científico como detentor da verdade e utilizar o conhecimento adquirido com suas vivências como forma de maior reflexão e problematização da situação discutida24.
Por muito tempo, ao falar sobre a prevenção do HIV, dava-se ênfase ao comportamento que poderia levar a infecção pelo vírus. Com isso, era comum a culpabilização dos indivíduos contaminados ou daqueles que se expuseram a doença. Isto permeava todo o cuidado ofertado no serviço de saúde e tinha por resultado afastar os indivíduos que deveriam ser acolhidos, testados e tratados23.
Para modificar esse cenário, que aumenta a vulnerabilidade dos diversos públicos que deveriam receber ações de prevenção ao HIV, é necessário que os serviços de saúde acolham, assistam e encaminhem adequadamente os adolescentes alvos de estratégias para prevenção do HIV, sem imprimir em suas ações qualquer julgamento ou juízo de valor relacionado aos adolescentes23.
Os resultados desta revisão apontam que os profissionais de saúde que atendem adolescentes reconheceram a importância da Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) e expressaram conforto e habilidades em fornecer cuidados afirmativos e aconselhamento de redução de risco. No entanto, a competência e o estigma associados à prescrição da PrEP variavam entre os profissionais12.
As altas taxas de HIV em adolescentes demonstram que os esforços empreendidos na prevenção da infecção nessa faixa etária são insuficientes e necessitam ser reavaliados e redirecionados para serem efetivos e que embora a PrEP seja uma intervenção de prevenção eficaz, a sua implantação junto à população adolescente apresenta particularidades do ponto de vista da bioética que devem ser consideradas25.
Outro ponto destacado foi o uso da tecnologia como facilitadora das estratégias de prevenção, tanto para divulgação de materiais educacionais on-line como para treinamentos on-line para apoiar competências e habilidades voltadas ao fornecimento de cuidados de saúde e educação abrangentes(12, 15).
O uso de ferramentas conectadas à internet como fontes de informação, permite que diferentes conhecimentos sejam adquiridos a partir do acesso aos conteúdos e da interação entre os indivíduos. O meio digital é ativamente utilizado nas ações cotidianas e como ferramentas de busca e atualização de profissionais e usuários. Contudo, precisa ser monitorado para que o conteúdo disseminado seja de qualidade e contribua efetivamente para a informação em saúde26.
Na adolescência os meios de comunicação estão presentes diariamente, e o seu uso para a promoção da saúde e prevenção de agravos, nos mais diferentes temas, vem crescendo. Assim, o uso da tecnologia é visto como uma ferramenta que abre novos caminhos e alternativas para a educação em saúde, permitindo que novos métodos sejam utilizados27.
Barreiras e desafios enfrentados nas atividades preventivas
As diversas estratégias apresentadas pelos enfermeiros para a prevenção do HIV em adolescentes, podem ser impactadas por barreiras e desafios existentes em sua execução. As dificuldades ressaltadas nos estudos incluem as advindas de recursos humanos e físicos dos serviços de saúde e as relacionadas aos aspectos pessoais e comportamentais dos adolescentes.
Ao se voltar para os recursos disponíveis, os enfermeiros destacaram deficiências na capacitação profissional, na composição de equipe e na oferta de suprimentos e espaço adequados para o desenvolvimento das ações de prevenção(13, 12, 14).
Estudo realizado junto a enfermeiros da Estratégia de Saúde da Família (ESF), aponta que os enfermeiros possuíam maior conhecimento e conduta profissional junto aos usuários quando eram capacitados há menos de um ano e possuíam pós-graduação relacionadas a prevenção do HIV28.
Assim, percebe-se a necessidade de capacitações constantes, desenvolvendo maior segurança e aptidão da equipe na realização das atividades de cuidado. Para tal, os serviços de saúde devem implantar as ações que acordam com a Política de Educação Permanente em Saúde, de modo que na prevenção do HIV em adolescentes haja promoção de uma abordagem ampla e pautada em conceitos e conhecimentos psicológicos, emocionais e sociais referentes ao HIV/AIDS29.
Em relação à estrutura física e insumos, estudo realizado junto a enfermeiras da ESF na região sudeste do Brasil, aponta fragilidades em suas unidades para recepção dos pacientes, o que dificulta o acolhimento e as ações de prevenção à população30. Em pesquisa realizada em 17 países nas regiões da África Oriental, Central e Austral, foi retratado baixa motivação no envolvimento das ações de prevenção, devido à falta de incentivo financeiro ou a não remuneração dos profissionais31.
Os achados demonstram igualmente as deficiências no treinamento e apoio clínico insuficiente, como desafios substanciais para o fornecimento eficaz da PrEP em serviços pediátricos de HIV32. Esses resultados corroboram com estudo que descreveu a falta de supervisão, de apoio e de orientação clínica para serviços de HIV que realizam a PrEP, especialmente, no que diz respeito ao treinamento inicial para os profissionais que atuarão em serviços especializados31.
Em relação aos aspectos individuais e comportamento dos adolescentes, uma das dificuldades encontradas em nossos resultados relaciona-se a fragilidade emocional e a crendice nos mitos relacionados ao HIV, gerando medo e vergonha de procurar os serviços de saúde, para abordagem de questões sexuais e reprodutivas. Com isso, há acesso deficiente e subutilização dos serviços de saúde por esse público, que impactam no conhecimento dos adolescentes sobre assuntos importantes a respeito da doença e de sua prevenção13.
Um dos meios de intervir no medo, vergonha e desconhecimento é a realização das ações de prevenção e promoção na escola e na comunidade, já que nelas os adolescentes conhecem os profissionais e obtém informações que estimulam seu acesso às instituições de saúde. Estudo demonstrou que os adolescentes entendem a importância do acesso aos serviços de saúde como forma de reduzir suas vulnerabilidades, que é impactado pelo conhecimento que eles têm sobre o funcionamento local e a facilidade de obter atendimento33.
No Brasil, os serviços que compõem a atenção primária a saúde são a porta de entrada para as redes de atenção. Para tanto, cabe a eles conhecer seu território e população de abrangência e oferecer acesso e integralidade na assistência ao usuário, em todas as suas necessidades e demandas34.
Outra fragilidade apontada relaciona-se modificar às práticas sexuais inseguras dos adolescentes, já que muitos não querem usar preservativos(12,13). Segundo os adolescentes, os motivos para que eles tenham relação sexual sem preservativo são inúmeros e se relacionam a aumentar o prazer sexual; a demonstrar confiança e fidelidade entre parceiros; a dificuldade em ter preservativos disponíveis, principalmente no caso das mulheres; nas relações esporádicas; e ao uso de álcool e outras drogas antes da relação33.
Por fim, outro obstáculo apontado foi o estigma do HIV, que interfere na decisão dos adolescentes aderirem às orientações de cuidados e prevenção com os parceiros, já que para tal precisam assumir perante aos demais seu comportamento e vulnerabilidade(13, 14, 12).
O estigma relacionado ao HIV/AIDS pode levar à rejeição ou julgamento da família e comunidade, fazendo com que os usuários contaminados tenham receio de frequentar os serviços especializados e/ou retirar seus medicamentos em serviços específicos por medo de encontrar alguma pessoa conhecida no local ou em seu entorno. Isso dificulta a prevenção de novos casos que possam decorrer de um adolescente com HIV/AIDS sendo assim necessário compreender a população vulnerável de forma singular para que ações inclusivas de promoção da saúde e conscientização sejam realizadas35.
CONCLUSÃO
Os resultados deste estudo apontam que os enfermeiros tem desenvolvido estratégias de cuidado na prevenção do HIV direcionado aos adolescentes, no entanto enfrentam desafios e barreiras na sua execução.
As estratégias de prevenção identificadas utilizam, principalmente, as tecnologias leves, como a comunicação, criação de vínculos e ambientes inclusivos. Destacam o uso de grupos educacionais em escolas, comunidade e serviços de saúde; o uso de protocolos e tecnologias existentes para prevenção do HIV/AIDS, o encaminhamento de referência para outros serviços e o uso de PrEP.
As barreiras identificadas relacionam-se a falta de capacitação profissional, suprimentos e espaços físicos inadequados, fragilidades emocionais, estigmas encontrados na comunidade, família e no próprio paciente relacionado a doença e as práticas sexuais inseguras que estão presentes principalmente junto aos adolescentes.
Conclui-se a necessidade de novos estudos que abordem este assunto, pois é fundamental na formação do enfermeiro e para a pratica de educação em saúde com a população jovem.
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