RELAÇÃO DA INFECÇÃO POR CITOMEGALOVÍRUS E TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: UMA REVISÃO DE ESCOPO
RELATIONSHIP OF CYTOMEGALOVIRUS INFECTION AND DOSAGE DISORDER AUTISTIC SPECTRUM: A SCOPE REVIEW
RELACIÓN DE LA INFECCIÓN POR CITOMEGALOVIRUS Y EL TRASTORNO DE DOSIFICACIÓN ESPECTRO AUTISTA: UNA REVISIÓN DEL ALCANCE
Autores:
Douglas Dos Santos Oliveira
Acadêmico de Enfermagem. Centro Universitário. Rio Branco. Acre. Brasil
Orcid: https://orcid.org/ 0009-0003-8159-3126
Ruth Silva Lima da Costa
Doutoranda em Epidemiologia em Saúde Pública ENSP/FIOCRUZ. Rio de Janeiro. RJ. Brasil
Orcid: https://orcid.org/0000-0003-1890-086X
RESUMO
O Transtorno do Espectro Autista afeta a comunicação, interação social e comportamento, variando em gravidade, e o Citomegalovírus, uma infecção congênita comum, está relacionado a deficiências no neurodesenvolvimento. Este estudo objetivou investigar a possível relação entre a infecção do citomegalovírus e o transtorno do espectro autista. Trata-se de revisão sistemática que analisou artigos publicados entre 2014 e 2024 nas seguintes bases de dados: Google Acadêmico, Scientific Eletronic Library Online, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde e National Library of Medicine. A possível associação pode depender do tempo de acompanhamento das amostras populacionais analisadas. Embora a relação direta entre eles ainda não seja totalmente elucidada cientificamente, há consenso de que a infecção pode comprometer o neurodesenvolvimento. As divergências nos resultados encontrados podem estar associadas às diferenças metodológicas entre os estudos, incluindo variações nos critérios diagnósticos, nos métodos de detecção da infecção e no controle de variáveis como predisposição genética e fatores ambientais.
DESCRITORES: Autismo; Desenvolvimento neuropsiquiátrico; Infecção congênita.
ABSTRACT
Autism Spectrum Disorder affects communication, social interaction and behavior, varying in severity, and Cytomegalovirus, a common congenital infection, is linked to neurodevelopmental disabilities. This study aimed to investigate the possible relationship between cytomegalovirus infection and autism spectrum disorder. This is a systematic review that analyzed articles published between 2014 and 2024 in the following databases: Google Scholar, Scientific Electronic Library Online, Latin American and Caribbean Literature in Health Sciences and National Library of Medicine. The possible association may depend on the follow-up time of the population samples analyzed. Although the direct relationship between them has not yet been fully scientifically elucidated, there is a consensus that the infection can compromise neurodevelopment. The divergences in the results found may be associated with methodological differences between the studies, including variations in diagnostic criteria, infection detection methods and control of variables such as genetic predisposition and environmental factors.
DESCRIPTORS: Autism; Neuropsychiatric development; Congenital infection
RESUMEN
El trastorno del espectro autista afecta la comunicación, la interacción social y el comportamiento, variando en gravedad, y el citomegalovirus, una infección congénita común, está relacionado con discapacidades del desarrollo neurológico. Este estudio tuvo como objetivo investigar la posible relación entre la infección por citomegalovirus y el trastorno del espectro autista. Se trata de una revisión sistemática que analizó artículos publicados entre 2014 y 2024 en las siguientes bases de datos: Google Académico, Biblioteca Electrónica Científica en Línea, Literatura Latinoamericana y del Caribe en Ciencias de la Salud y Biblioteca Nacional de Medicina. La posible asociación puede depender del tiempo de seguimiento de las muestras de población analizadas. Aunque aún no se ha dilucidado científicamente la relación directa entre ellos, existe consenso en que la infección puede comprometer el neurodesarrollo. Las divergencias en los resultados encontrados pueden estar asociadas con diferencias metodológicas entre los estudios, incluidas variaciones en los criterios de diagnóstico, métodos de detección de infecciones y control de variables como la predisposición genética y factores ambientales.
DESCRIPTORES: Autismo; Desarrollo neuropsiquiátrico; Infección congénita
Recebido: 24/02/2025 Aprovado: 05/03/2025
Tipo de artigo: Revisão de Escopo
INTRODUÇÃO
O citomegalovírus (CMV) é um vírus pertencente à família dos herpesvírus que pode afetar indivíduos de todas as idades, com alta prevalência na população mundial (1). Na maioria dos casos, a infecção por CMV é assintomática ou apresenta sintomas leves, podendo ser transmitido por fluidos corporais de pessoas infectadas, como saliva, urina e sangue, e ser transmitido de mãe para filho durante a gravidez ou parto (2).
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um distúrbio caracterizado pela alteração das funções do neurodesenvolvimento, que podem englobar alterações qualitativas e quantitativas da comunicação, seja na linguagem verbal ou não verbal, na interação social e do comportamento, comumente perceptíveis a partir de ações repetitivas, hiperfoco para objetos específicos e restrição de interesses (3). Dentro do espectro são definidos graus que podem ser leves e com total independência, apresentando discretas dificuldades de adaptação, até níveis de total dependência para atividades cotidianas ao longo de toda a vida (4).
O CMV é a infecção congênita mais comum globalmente, com uma incidência estimada entre 0,6% e 0,7% de todos os nascidos vivos em países em desenvolvimento (2). A carga de doenças associadas ao CMV congênito é significativa, sendo a principal causa não genética de perda auditiva neurossensorial e uma importante responsável por deficiências no neurodesenvolvimento infantil (5).
O TEA é um problema de saúde emergente que afeta aproximadamente 1 em cada 68 crianças (6). A taxa de incidência do autismo aumentou três vezes nas últimas três décadas e devido à sua etiologia complexa, um número específico de crianças com a condição, não recebe o tratamento comportamental e medicamentoso adequado (7).
O CMV e o TEA podem estar interligados devido ao potencial impacto do vírus no desenvolvimento neurológico (8). Embora o TEA resulte de uma combinação de fatores genéticos e ambientais, infecções virais, como Citomegalovírus, podem aumentar o risco de desenvolvimento do transtorno, especialmente em casos graves de infecção (9). Compreender essa relação pode levar ao desenvolvimento de programas de triagem durante a gravidez ou logo após o nascimento, permitindo monitoramento e intervenção precoce, o que pode ajudar a mitigar ou até prevenir o desenvolvimento do TEA (10).
A correlação entre infecção congênita por CMV e o TEA tem sido objeto de diversas investigações. Estudos sugerem que a infecção por CMV durante a gravidez pode interferir no desenvolvimento neurológico fetal, podendo contribuir para o desenvolvimento do TEA (11). No entanto, a conexão entre a infecção por CMV e o desenvolvimento de TEA ainda não está completamente esclarecida.
Assim, investigar essa relação pode revelar achados sobre os mecanismos patológicos que afetam o TEA e melhorar a compreensão de como o CMV afeta o desenvolvimento cerebral. Essa investigação pode ser fundamental para o desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas e estratégias de intervenção.
Nesse sentido, objetivo desse estudo é investigar a possível relação entre a infecção do citomegalovírus e o transtorno do espectro autista.
MÉTODO
As diretrizes PRISMA (Revisão Sistemática e Protocolos de Meta-Análise), cujo acesso é livre, foram adotadas para realizar essa revisão sistemática.
Os pesquisadores buscaram, de modo independente, os bancos de dados Scientific Eletronic Library Online (SCIELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), National Library of Medicine (PubMed/Medline) e Google Acadêmico para todos os artigos originais que responderam a seguinte questão norteadora: Qual é a relação entre a infecção congênita por citomegalovírus e o risco de desenvolvimento do Transtorno do Espectro Autista em crianças?
A estratégia de busca em todas as bases de dados foi baseada em três descritores do MeSH terms (Medical Subject Headings), a saber: relationship and cytomegalovirus infection and autism spectrum disorder e o uso de operadores booleanos AND e OR para aumentar o alcance de estudos sobre o tema, publicados no período compreendido entre 2014 a 2024.
Diante dos artigos selecionados, buscou-se um consenso entre os pesquisadores para definir os artigos que estiveram de acordo com os critérios de inclusão.
A seleção inicial foi feita a partir do título e resumo de todos os artigos encontrados. Os estudos duplicados foram removidos comparando os autores, o título, o ano e o periódico de publicação. Após a triagem inicial, todos os estudos potencialmente relevantes foram avaliados para elegibilidade.
A exclusão dos estudos foi baseada em critérios bem definidos da seguinte forma: artigos duplicados, estudos artigos que não respondiam à questão norteadora da pesquisa e artigos de revisão de literatura de qualquer tipologia. Os critérios de inclusão foram: Artigos originais, texto completo, publicados no período de 2014 a 2024, escritos em português ou inglês, disponíveis eletronicamente e que abordassem o tema da questão norteadora da pesquisa.
Os dados qualitativos foram extraídos de todos os artigos incluídos. A extração de dados foi classificada da seguinte forma: 1) características da publicação: autor, ano, revista e país; 2) características do indivíduo: sexo e faixa etária; 3) relação entre a infecção congênita por citomegalovírus e o risco de desenvolvimento do Transtorno do Espectro Autista: avaliação da correlação entre as patologias e 4) descrição dos principais resultados encontrados.
Inicialmente foram identificados 6.872 artigos durante a busca eletrônica dos quais 6.860 foram obtidos a partir da base de dados do Google Acadêmico e 12 do PUBMED. A busca realizada nas plataformas SCIELO e MEDLINE não encontrou nenhum estudo.
Após a seleção dos artigos seguindo os critérios estabelecidos nesse estudo, foram considerados elegíveis 15 artigos que abordaram a correlação entre a infecção por Citomegalovírus e o desenvolvimento do Transtorno do Espectro Autista publicados entre os anos de 2014 e 2024 (Figura 1).
Figura 1. Busca, seleção e inclusão de estudos que abordaram a correlação entre a infecção por Citomegalovírus e o desenvolvimento do Transtorno do Espectro Autista publicados entre os anos de 2014 e 2024
Fonte: Autoria Própria, 2025.
Considerando que os dados coletados foram de bases secundárias, sem a identificação do participante da pesquisa, não se fez necessária a submissão do estudo ao Comitê de Ética em Pesquisa.
RESULTADOS
Após definição dos estudos inclusos nessa revisão, foi realizada a extração dos dados, que consistiu em enfatizar nas características da publicação: autor, ano, revista e país; nas características da amostra: sexo e faixa etária; na relação entre a infecção congênita por citomegalovírus e o risco de desenvolvimento do Transtorno do Espectro Autista e na descrição dos principais resultados encontrados (Quadro 1).
Quadro 1. Artigos selecionados para composição da pesquisa.
AUTOR/ ANO | REVISTA | PAÍS | AMOSTRA POPULACIONAL ESTUDADA | FAIXA ETÁRIA | METODOLOGIA UTILIZADA PARA AVALIAR A CORRELAÇÃO ENTRE CMV E TEA | PRINCIPAIS ACHADOS |
Gentile et al., 2014 (12) | In Vivo | Itália | 54 crianças com TEA e 46 controles | 5-6 anos | Comparação das taxas de soropositividade e os títulos de anticorpos para Citomegalovírus em crianças com TEA e em tratamentos controle. | A taxa de soropositividade e os títulos de anticorpos para Citomegalovírus foram semelhantes entre crianças com TEA e controles saudáveis. |
Sakamoto et al., 2015 (13) | Brain and Development | Japão | 27 crianças | 4 -12 anos | A infecção foi identificada através de PCR em amostras de sangue seco e cordão umbilical. As crianças com TEA foram avaliadas quanto ao desenvolvimento neurológico. | Os dados sugerem uma possível associação entre a presença do vírus e o autismo, considerando fatores como histórico perinatal e atraso no desenvolvimento. |
Engman et al., 2015 (14) | Acta pediátrica | Suécia | 115 crianças | *NE | Em um grupo representativo de 115 crianças pré-escolares com transtorno do espectro autista, das quais 33 também tinham deficiência intelectual, as manchas de sangue seco da triagem metabólica neonatal foram analisadas para DNA de CMV usando a reação em cadeia da polimerase TaqMan. | Uma das 33 crianças com transtorno do espectro autista e deficiência intelectual – 3% desse grupo – tinha infecção congênita por CMV. A prevalência correspondente em recém-nascidos na Suécia é de 0,2%. Nenhuma das 82 crianças sem deficiência intelectual tinha CMV congênito. A descoberta dá mais suporte para o CMV congênito ser uma das muitas etiologias subjacentes ao transtorno do espectro autista com deficiência intelectual. |
Gentile et al., 2017 (15) | In Vivo | Itália | 82 crianças (38 com TEA e 44 controles) | 0-8 anos | O genoma do Citomegalovírus foi testado por reação em cadeia da polimerase (PCR) em amostras de sangue seco coletadas ao nascimento das crianças. | A prevalência de infecção congênita por Citomegalovírus foi de 5,3% (2/38) nos casos e 0% (0/44) nos controles. |
Alibek et al. 2019 (16) | J Neurol Psychiatr Disord | Ásia Central e Europa Oriental. | 57 crianças com TEA | *NE | Foi realizada uma avaliação de 57 crianças com transtorno do espectro autista (TEA) da Ásia Central e da Europa Oriental, utilizando questionários, análises laboratoriais de parâmetros sanguíneos e identificação de sinais de inflamação e disfunção imunológica. | Os resultados indicaram múltiplos sinais de infecção e deficiência de folato, sugerindo que essas alterações, iniciadas durante a gestação, podem estar associadas ao desenvolvimento do TEA. |
Lin et al., 2021 (8) | Children | China | 69 crianças | 0-18 anos | O estudo analisou os dados de 69 crianças com infecção confirmada por Citomegalovírus e 292 crianças com outras infecções (grupo controle). Eles compararam os riscos de epilepsia e TEA entre os dois grupos. | O risco de desenvolver transtorno do espectro autista foi mais alto no grupo Citomegalovírus (17,9 vezes mais risco). |
Yang et al., 2022 (17) | Microbiology Spectrum | China | 308 crianças | *NE | Combinação de análise sorológica, detecção de DNA e proteínas do Citomegalovírus, e análise multifatorial. | A seroprevalência do Citomegalovírus foi significativamente maior em pacientes com Complexo de Esclerose Tuberosa e autismo, em comparação com pacientes com Complexo de Esclerose Tuberosa sem autismo (89,2% e 75,1%, respectivamente). |
Zhang et al., 2023 (18) | BMC Psychiatry | Finlândia | Dados retirados de banco de dados com informações genéticas | *NE | Para investigar a associação entre infecção por Citomegalovírus e TEA, foi realizada randomização mendeliana (RM) de 2 amostras, utilizando dados resumidos de estudos de associação genômica de amplo espectro (GWAS) do FinnGen e do projeto IEU Open GWAS. | A infecção por Citomegalovírus não aumenta significativamente o risco de TEA. |
Zappas et al., 2023 (19) | The Journal for Nurse Practitioners | EUA | 1 criança | 23 meses | Relato de caso que aborda todo o processo de acompanhamento médico durante 20 meses de uma criança que nasceu com citomegalovírus. | O estudo sugere que essa criança com atraso no desenvolvimento e regressão de linguagem, apresenta características compatíveis com o transtorno do espectro autista (TEA), possivelmente relacionadas à infecção congênita por CMV. |
Hassan et al., 2023 (20) | Parasitology Research | Egito | 45 crianças autistas e 45 crianças controles | 3-16 anos | As amostras de sangue foram coletadas e testadas para a presença de anticorpos e DNA de Toxoplasma e Citomegalovírus (IgG e IgM) por ELISA e PCR em tempo real (RT-PCR), respectivamente. | Não foi observada diferença significativa entre crianças autistas e crianças de controle quanto à prevalência geral de infecção por Toxoplasma e/ou Citomegalovírus. |
Marcuzzo et al., 2021 (21) | Revista da AMRIGS | Brasil | 82 crianças | A idade das crianças variou entre um mês e um dia e 5,42 anos, sendo 28,0% com um ano completo. | Estudo de coorte retrospectivo, realizado com pacientes pediátricos atendidos em 2017, em um ambulatório materno-infantil da Universidade do Sul de Santa Catarina. Os dados foram obtidos dos prontuários físicos dos pacientes, exclusivos do serviço de neurogenética | Entre as intercorrências maternas durante a gestação, a infecção por citomegalovírus (CMV) foi uma das condições relacionadas, juntamente com rubéola e toxoplasmose (2,4%). Além disso, entre os diagnósticos neurogenéticos encontrados, 12,3% foram de TEA. Esses achados sugerem uma possível associação entre infecções congênitas, incluindo o CMV, e o desenvolvimento do TEA, reforçando a importância do acompanhamento pré-natal e da vigilância para fatores de risco neurogenéticos. |
Keymeulen, et al. 2023 (22) | Early human development | Bélgica | 753 crianças | *NE | Todas as crianças com cCMV, incluídas no registro CMV flamengo, eram elegíveis para este estudo. Dados sobre o resultado do neurodesenvolvimento estavam disponíveis em 753 crianças. Dados sobre o resultado neuromotor, cognitivo, comportamental, audiológico e oftalmológico foram analisados. | O estudo encontrou uma relação entre a infecção congênita por citomegalovírus (CMV) e o transtorno do espectro autista (TEA), evidenciada pela maior frequência de diagnóstico de TEA em crianças com CMV em comparação com a população geral de Flandres (2,5% versus 0,7%). |
Pesch et al., 2024 (23) | Pediatrics | EUA | 2 989 659 crianças | 4-7 anos | Estudo de coorte usando dados do MEDICAID de 2014 a 2020. Foram códigos de diagnóstico para identificar CMV (exposição), TEA (resultado) e covariáveis entre crianças inscritas desde o nascimento até ≥4 a <7 anos. | Entre 2 989 659 crianças, foi identificado 1044 (3,5 por 10 000) crianças com cCMV e 74 872 (25,0 por 1000) crianças com TEA. Crianças com diagnóstico de CMV, eram mais propensas a ter diagnósticos de TEA. |
Maltsev et al., 2024 (24) | BMC Pediatrics | Rússia | 187 meninos e 63 meninas com Deficiência Genética do Ciclo do Folato e manifestações clínicas de Transtorno do Espectro Autista e 53 crianças saudáveis | 2-9 anos | Foram analisados dados médicos de 240 crianças com deficiência genética do ciclo do folato e manifestações clínicas de transtorno do espectro autista. Foram utilizados métodos diagnósticos para detecção das infecções virais e bacterianas. | Foi identificado que 11% das crianças com TEA associadas à Deficiência Genética do Ciclo do Folato apresentaram infecção neurológica congênita por Citomegalovírus. |
EGILMEZER et al., 2024 (25) | Communications Biology | Reino Unido | O estudo não envolveu seres humanos diretamente, mas sim modelos laboratoriais baseados em células humanas para simular o desenvolvimento cerebral | Não especificado | O estudo usou organoides cerebrais humanos infectados com Citomegalovírus para analisar os efeitos da infecção sobre vias celulares relacionadas ao desenvolvimento cerebral. | A infecção por citomegalovírus em organoides cerebrais humanos resultou na disfunção de 236 genes relacionados ao autismo, indicando uma possível ligação entre a infecção congênita por CMV e o desenvolvimento de TEA |
*NE -Não Especificado
Fonte: Autoria Própria, 2025.
DISCUSSÃO
A relação entre o CMV e o provável desenvolvimento do TEA tem instigado diversos pesquisadores ao redor do mundo. Estudos sugerem um aumento significativo no risco de desenvolver TEA em crianças infectadas por CMV (8), (21), (23), (24). Em um estudo mais recente, encontrou-se uma maior frequência de diagnóstico de TEA em crianças com CMV, com 2,5% das crianças com infecção congênita por CMV diagnosticadas com TEA, em comparação com 0,7% na população geral (22).
No entanto, outros estudos não encontraram diferenças significativas entre crianças infectadas e tratamento controle (20), (30). Assim, afirmar a associação positiva entre essas patologias necessita cautela, pois diversas variáveis como a metodologia empregada na avaliação e as características específicas da amostra devem ser elucidadas com mais clareza.
Outro aspecto que pode explicar a ausência de correlação significativa entre eles, em determinados estudos é a limitação temporal das avaliações neurodesenvolvimentais que analisam biomarcadores virais e fatores genéticos sem acompanhamento longitudinal, limitando-se a avaliações pontuais (12), (18), (21) (30).
Outros estudos que identificaram associação entre CMV e desfechos neurodesenvolvimentais, priorizaram o acompanhamento até idades mais avançadas, de modo a permitir a observação de prováveis impactos tardios (8), (27), (29). No estudo de Lin et al. (2021 (8), por exemplo, ao comparar grupos infectados e controles até os 18 anos, encontrou um risco 17,9 vezes maior de TEA no grupo infectado por Citomegalovírus. Assim, diferentes achados quanto a essa correlação estão associados ao tempo de observação das amostras populacionais, sugerindo que os efeitos do CMV sobre o neurodesenvolvimento possam se manifestar de maneira expressiva em avaliações a longo prazo.
Mesmo que alguns estudos não tenham objetivado investigar uma associação direta entre a infecção por Citomegalovírus e o Transtorno do Espectro Autista de início, alguns resultados encontrados permitem inferir que a infecção congênita por CMV pode estar relacionada a prejuízos no desenvolvimento neuropsicológico. Um estudo observou que 40% das crianças infectadas apresentaram anomalias no desenvolvimento neuro cognitivo (29).
Outro estudo relatou dificuldades específicas em habilidades pragmáticas e em tarefas de memória de trabalho fonológica, sugerindo que os efeitos da infecção podem ser amplos, afetando não apenas aspectos motores e sensoriais, mas também funções cognitivas e comportamentais (28).
Outros estudos mais recentes têm destacado o uso de modelos laboratoriais para avaliar a associação entre CMV e TEA. Por exemplo, um estudo utilizou organoides cerebrais humanos para demonstrar que a infecção por Citomegalovírus pode interferir em genes relacionados ao autismo, sugerindo a existência de um possível mecanismo genético e celular subjacente à associação (14). Assim, é urgente a necessidade de investigações adicionais que preencham as lacunas sobre a forma como a infecção por Citomegalovírus pode impactar o desenvolvimento cerebral.
Outro fator observado a partir do levantamento de dados são as limitações nas metodologias desses estudos, uma vez que a abordagem para avaliar a infecção por Citomegalovírus e o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista variaram de maneira considerável. Alguns estudos utilizaram PCR a partir de amostras de sangue seco (15), enquanto outros analisaram anticorpos (20), e outros ainda optaram pelo emprego de questionários e avaliações clínicas (29) e outros utilização dados secundários (22) e (23) e outro análise de prontuários (21). Assim, é importante destacar que as discrepâncias metodológicas observadas podem ser limitantes para a projeção de inferências sobre os principais resultados encontrados.
As metodologias dos estudos sobre a relação entre infecção por Citomegalovírus e Transtorno do Espectro Autista apresentam variações significativas, como o uso de PCR em sangue seco (15), análise de anticorpos (20) e questionários clínicos (29). Essas diferenças metodológicas podem limitar as conclusões definitivas e ressaltam a necessidade de maior padronização nas abordagens para estudar essa relação.
Além disso, novos modelos laboratoriais têm sido utilizados para explorar essa relação. Um estudo por exemplo, utilizou organoides cerebrais humanos infectados por CMV, identificando disfunções em 236 genes relacionados ao autismo, sugerindo uma possível ligação biológica entre a infecção e o desenvolvimento de TEA (25).
Por outro lado, estudos como o de Zhang et al. (2023) (18) não encontraram uma associação significativa entre a infecção por CMV e o risco de TEA, utilizando uma abordagem de randomização mendeliana baseada em dados genéticos. Isso indica a necessidade de mais investigações para esclarecer a real contribuição do CMV no desenvolvimento do TEA, uma vez que há variabilidade nos resultados encontrados.
Esses achados destacam a complexidade da associação entre CMV e TEA e sugerem a importância de continuar a pesquisa sobre os mecanismos subjacentes, bem como de considerar as diferentes metodologias e populações estudadas.
Além disso, muitos estudos não controlaram rigorosamente variáveis importantes, como prematuridade, condições genéticas e fatores ambientais, que podem influenciar significativamente o neurodesenvolvimento das crianças. Um exemplo disso é o estudo de Yang et al. (2022) (17), que ao comparar grupos com Esclerose Tuberosa, observou o impacto das comorbidades preexistentes nos desfechos analisados, destacando a importância de um delineamento metodológico que leve em consideração o controle dessas variáveis
No que tange a aspectos clínicos e preventivos, a possibilidade de a infecção congênita por Citomegalovírus influenciar alterações no neurodesenvolvimento reforça a relevância do rastreio e da adoção de medidas preventivas durante a gestação. Um estudo realizado, ao investigar os efeitos do tratamento com Valganciclovir, trouxe novas perspectivas sobre intervenções médicas que podem ser úteis se destinadas a atenuar eventuais impactos no desenvolvimento infantil (27).
As principais limitações desta revisão sistemática incluem a variedade nos métodos de diagnóstico da infecção por Citomegalovírus e do Transtorno do Espectro Autista, a falta de controle rigoroso sobre variáveis como fatores genéticos e ambientais, o tamanho limitado das amostras e a duração curta do acompanhamento. Além disso, os estudos observacionais dificultam a formulação de conclusões causais definitivas, e a ausência de padronização nas abordagens metodológicas gera discrepâncias nos resultados, afetando a interpretação e comparabilidade dos achados.
CONCLUSÕES
A possibilidade de associação entre a infecção congênita por Citomegalovírus e o Transtorno do Espectro Autista parece depender do tempo de acompanhamento das amostras estudadas. Estudos com seguimento prolongado indicam maior probabilidade de TEA em crianças expostas ao CMV, enquanto pesquisas com avaliações pontuais ou de curta duração não encontraram correlação significativa.
Embora a relação exata entre CMV e TEA ainda não seja totalmente esclarecida, os dados sugerem que a infecção pode comprometer o neurodesenvolvimento, resultando em déficits cognitivos, atrasos na linguagem e dificuldades comportamentais. As discrepâncias nos resultados podem ser atribuídas a diferentes metodologias, como critérios de diagnóstico, métodos de detecção e controle de variáveis como predisposição genética e fatores ambientais.
Recomenda-se a padronização dos métodos e o aumento do período de acompanhamento e da amostra populacional para melhor compreensão dos mecanismos envolvidos, contribuindo para estratégias de prevenção e manejo das consequências do CMV no neurodesenvolvimento.
REFERÊNCIAS