PARTOS VERTICALIZADOS E OCORRÊNCIA DE LACERAÇÕES PERINEAIS EM CASA DE PARTO DO DISTRITO FEDERAL

PARTOS VERTICALIZADOS E OCORRÊNCIA DE LACERAÇÕES PERINEAIS EM  CASA DE PARTO DO DISTRITO FEDERAL

VERTICAL DELIVERIES AND THE OCCURRENCE OF PERINEAL LACERATIONS IN A BIRTHING CENTER IN THE FEDERAL DISTRICT

PARTOS VERTICALES Y OCURRENCIA DE LACERACIONES PERINEALES EN UN CENTRO DE PARTOS DEL DISTRITO FEDERAL

AUTORES

Ana Beatriz Sousa Brito - Enfermeira, bacharel e licenciada pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília- CEUB, pós graduada em gestão hospitalar pela FAVENI, atual residente do programa de residência de enfermagem obstétrica da Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências de Saúde do Distrito Federal e pesquisadora na área de saúde da mulher, ginecologia e obstetrícia e saúde coletiva. ORCID:0000-0002-5691-3904

Hygor Alessandro Firme Elias - Enfermeiro e Biólogo, bacharel e licenciado pela Universidade de Brasília - UnB. Mestre em Enfermagem pela Faculdade de Ciências da Saúde do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein. ORCID:0002-4285-902x

RESUMO

Objetivo: Comparar as distintas posições verticalizadas adotadas por parturientes durante o trabalho de parto, associando à ocorrência de possíveis lacerações perineais e seus respectivos graus. Metodologia: Trata-se de um estudo epidemiológico, observacional, descritivo, transversal, retrospectivo, de abordagem quantitativa. O estudo foi realizado na Casa de Parto de São Sebastião, localizada no Distrito Federal, a qual contou com uma amostra aleatória de 499 mulheres, que tiveram seus partos no período de janeiro de 2018 a dezembro de 2021. Resultados: O estudo apontou que 354 mulheres adotaram posições verticalizadas durante o período expulsivo e 249 obtiveram algum grau de laceração; já 145 adotaram posições não verticalizadas e 74 tiveram algum grau de laceração. Entre as posições verticalizadas, a mais adotada foi com o uso da banqueta de parto (37%). Conclusão: As posições verticalizadas estão associadas ao maior número de lacerações, porém o grau da laceração varia entre as posições. 

DESCRITORES: Parto; Obstetrícia; Lacerações; Trabalho de parto; Enfermagem obstétrica;

ABSTRACT

Objective: To compare the different upright positions adopted by parturients during labor, associating them with the occurrence of possible perineal lacerations and their respective degrees. Methodology: This is an epidemiological, observational, descriptive, cross-sectional, retrospective study with a quantitative approach. The study was carried out at the Casa de Parto de São Sebastião, located in the Federal District, which had a random sample of 499 women who gave birth between January 2018 and December 2021. Results: The study found that 354 women adopted upright positions during the expulsive period and 249 had some degree of laceration; 145 adopted non-upright positions and 74 had some degree of laceration. Among the upright positions, the most commonly adopted was the use of the birthing stool (37%). Conclusion: Upright positions are associated with a higher number of lacerations, but the degree of laceration varies between positions. 

DESCRIPTORS: Childbirth; Obstetrics; Lacerations; Labor and delivery; Obstetric nursing;

RESUMEN

Objetivo: Comparar las diferentes posiciones erguidas adoptadas por las parturientas durante el trabajo de parto, asociándolas con la ocurrencia de posibles laceraciones perineales y sus respectivos grados. Metodología: Se trata de un estudio epidemiológico, observacional, descriptivo, transversal, retrospectivo y con abordaje cuantitativo. El estudio se realizó en la Casa de Parto de São Sebastião, ubicada en el Distrito Federal, que contó con una muestra aleatoria de 499 mujeres que dieron a luz entre enero de 2018 y diciembre de 2021. Resultados: El estudio encontró que 354 mujeres adoptaron posiciones erguidas durante el período expulsivo y 249 tuvieron algún grado de laceración; 145 adoptaron posiciones no erguidas y 74 tuvieron algún grado de laceración. Entre las posturas erguidas, la más adoptada fue el uso del taburete de parto (37%). Conclusión: Las posiciones verticales se asocian con el mayor número de laceraciones, pero el grado de laceración varía entre las posiciones. 

DESCRIPTORES: Parto; Obstetricia; Laceraciones; Trabajo de parto; Enfermería obstétrica;

Recebido: 31/01/2024 Aprovado: 22/02/2024

Tipo de artigo: Artigo Original 

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, o parto visto como um evento natural e fisiológico foi desconstruído, uma vez que a medicalização e a instrumentação de forma desordenada ganharam espaço no cenário obstétrico, reduzindo o protagonismo da mulher e limitando sua liberdade de posição durante o trabalho de parto e parto1,2.

Em vista desse cenário, as taxas de partos instrumentalizados em posições horizontalizadas e cesarianas se elevaram consideravelmente, o que motivaram discussões acerca da necessidade de mudanças no cenário obstétrico brasileiro em busca do desenvolvimento de novas práticas que respeitassem a fisiologia, o empoderamento feminino e o protagonismo da mulher durante o parto. Novas técnicas menos invasivas foram implementadas ao parto, através do resgate do conhecimento das parteiras tradicionais e o aprimoramento dos conhecimentos já existentes através de estudos científicos3.

Em 14 de fevereiro de 2017 foi publicada pelo Ministério da Saúde a Portaria Nº 353, que aprova as Diretrizes Nacionais de Assistência ao Parto Normal. Essa portaria tem o intuito de direcionar a assistência da equipe de saúde responsável pelo atendimento às gestantes, viabilizando as boas práticas obstétricas. Entre elas se encontra o livre posicionamento da mulher durante o trabalho de parto e o encorajamento por parte dos profissionais de saúde em auxiliar a mudança de posição da mulher4.

As posições adotadas pelas gestantes em trabalho de parto são diversas e variam conforme o conforto materno. Tradicionalmente, as parteiras estimulavam as mulheres adotarem posições verticalizadas e a movimentação constante, visando facilitar a evolução do trabalho de parto. Atualmente, estudos mostram que as posições verticalizadas trazem diversos benefícios às mulheres que se sentem confortáveis em adotá- las5,6.

As posições verticalizadas favorecem a descida fetal pelo canal de parto devido a ação gravitacional, além de auxiliar na modificação da angulação da pelve materna. Em conjunto à abertura pélvica, oportunizado pelo hormônio relaxina circulante na corrente sanguínea materna, há também a movimentação do cóccix através da retropulsão, que possui o intuito de ampliar o trajeto duro do canal de parto. A liberdade de movimentação pélvica e a retropulsão do cóccix só é possível em posições verticalizadas, pois evitam a compressão dessa estrutura7,8.

A verticalização materna apresenta estímulo positivo no apagamento do colo, uma vez que a descida fetal é facilitada com o posicionamento e a compressão do colo pelo pólo cefálico. Além disso, o posicionamento verticalizado favorece a descompressão da artéria aorta e da veia cava, ampliando a oxigenação fetal no trabalho de parto. A respiração materna também é facilitada, uma vez que a mulher tem sua maior expansão pulmonar devido à descompressão dos pulmões pelo fundo uterino9.

A laceração é representada pela descontinuidade tissular acompanhada ou não de sangramento, a depender das estruturas acometidas. Quando relacionada ao parto, a laceração está associada à passagem fetal pelo canal de parto, podendo acometer pele, mucosa, tecido muscular e esfíncter anal. As regiões acometidas variam entre colo uterino, canal vaginal, fúrcula, períneo e ânus8.

As lacerações são classificadas em graus, a depender dos tecidos afetados, sendo 1º grau, quando há o acometimento do epitélio vaginal e pele; 2º grau, quando há o acometimento da fáscia muscular, musculatura transversa do períneo e bulbo esponjoso; 3º grau, quando relacionada á descontinuidade do esfíncter externo do ânus; 4º grau, no acometimento do esfíncter interno do ânus e mucosa retal. De acordo com a resolução COFEN nº 516 de 23/06/2016, o enfermeiro obstetra está habilitado para realizar a episiorrafia de lacerações de 1º e 2º grau. As episiorrafias devem ser realizadas quando há alteração anatômica perineal ou em caso de sangramento ativo, com o intuito de promover a hemostasia na região.

Não obstante, a ocorrência de lacerações perineais apresenta incômodo físico para a paciente, uma vez que a puérpera tende a apresentar uma queda da imunidade considerável durante o período, dificultando o processo de cicatrização da região acometida. Isto aumenta consideravelmente os riscos para infecções locais e uterinas, perda de força muscular perineal, alteração da anatomia vaginal, surgimento de granulomas ou queloides no local da rafia10.

O presente estudo tem como objetivo comparar as posições verticalizadas, tais como cócoras, parto com auxílio de banqueta de parto, decúbito lateral (esquerdo ou direito) e posição em quatro apoios adotadas pelas gestantes que se encontram no período expulsivo, associando à ocorrência de lacerações perineais e seus respectivos graus.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo epidemiológico, observacional, descritivo, transversal, retrospectivo, de abordagem quantitativa.

O estudo foi realizado na Casa de Parto de São Sebastião, localizada no Distrito Federal. Trata-se de um Centro de Parto Normal do tipo peri-hospitalar, que atende a população de São Sebastião, Jardins Mangueiral, Jardim Botânico, Itapoã, Paranoá, todos localizados na região de saúde Leste do Distrito Federal, e ainda municípios de Minas Gerais e Goiás como Buritis, Cabeceira Grande, Unaí, Parque das Américas, Jardim ABC, Marajó, conforme portaria de vinculação número 1321 de 2018 da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal. A Casa de Parto é uma unidade do SUS credenciada pelo Ministério da Saúde, vinculada ao hospital de referência na Região Leste - HRL (antigo hospital do Paranoá).

A pesquisa contou com uma amostra aleatória de 499 mulheres, dentro dos critérios de inclusão propostos pelo estudo. A amostra utilizada na pesquisa foram as parturientes que tiveram seus partos na Casa de Parto de São Sebastião no Distrito Federal, no período de janeiro de 2018 a dezembro de 2021, com idade igual ou superior a 18 anos na data do evento e que adotaram posição vertical em quatro apoios, cócoras, uso da banqueta e decúbitos laterais direito ou esquerdo e posições não vertilacizadas como semi-sentado e litotomia . Os critérios de exclusão são: pacientes que foram removidas para o hospital de referência antes ou durante o período expulsivo por qualquer causa.

Os dados foram disponibilizados pela gerência da Casa de Parto, já planilhados, inominados e sem qualquer tipo de identificação das pacientes, visto que, estes já fazem parte dos indicadores da Rede Cegonha, os quais são repassados para o Ministério da Saúde anualmente. A pesquisa contou com o uso da plataforma Google Drive, Google Planilhas e Microsoft Office 365 para sua produção. Por se tratar de uma pesquisa com seres humanos, passou pela aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa CAAE 71464823.9.0000.5553.

RESULTADOS

A tabela 1 refere-se às distintas posições adotadas pelas parturientes durante o trabalho de parto, sendo dividida entre posições que se enquadram como posições verticalizadas (banqueta de parto, quatro apoios, cócoras e décubito lateral) e não verticalizadas (semi-sentada e litotômica). Do total da amostra, N =145 (27,07%) pariram em posições não verticalizadas, enquanto N= 354 (72,30%) adotaram posições verticalizas. Dentre as verticalizadas, a preferida foi o uso da banqueta de parto N=130 (26,05%), seguida da posição decúbito lateral N=125 (25,05%). Cerca de 20% optaram pela posição de quatro apoios e cócoras. 

Tabela 1. Número de pacientes por posição de parto verticalizados e não verticalizados ‘

 

Posição

N (%)

Partos verticalizados

   
 

Banqueta de parto

130 (26,05)

 

Quatro Apoios

94 (18,85)

 

Cócoras

5 (1,00)

 

Decúbito Lateral

125 (25,05)

Partos não verticalizados

   
 

Semi-sentada

135 (27,05)

 

Litotômica

10 (2,00)

TOTAL

 

499 (100)

Já aquelas que optaram por posições não verticalizadas, a mais adotada foi a semi-sentada N=135 (27,05%), correspondendo a quase totalidade do grupo. Somente 2% utilizaram a posição litotômica. 

A tabela 2 demonstra a ocorrência de lacerações nas diferentes posições de parto e as compara entre si. Na amostra do estudo (N=499) ocorreram 323 lacerações, o que corresponde a 64,73% do total. Portanto, houve 35,27% de períneos íntegros, independentemente da posição de parto adotada. Dentre as posições de parto, o maior quantitativo de períneos integros ocorreu com o parto em posição semi-sentada N=66 (37,50%), em contraponto à posição de cócoras com somente duas pacientes (1,14%) com integridade perineal. As lacerações estiveram presentes com mais frequência na posição verticalizada com apoio da banqueta de parto N=103 (31,89%), seguida do decúbito lateral N=83 (25,70%) e da posiçao quatro apoios N=60 (18,57%). O comparativo das posições em relação às lacerações revela que as posições verticalizadas N=249 (77,08%) correspondem a maioria das posições ligadas às lacerações. 

Tabela 2. Posição de parto x ocorrência de laceração

Posição

Não laceração

Laceração

N (%)

N (%)

Banqueta de parto

27 (15,34)

103 (31,89)

Cócoras

2 (1,14)

3 (0,93)

Decúbito lateral

42 (23,86)

83 (25,70)

Quatro apoios

34 (19,32)

60 (18,57)

Litotômica

5 (2,84)

5 (1,55)

Semi-sentada

66 (37,50)

69 (21,36)

TOTAL

176 (100)

323 (100)

 

A tabela 3 apresenta os graus de laceração relacionados às posições de parto, onde a laceração de 1° grau é mais frequente no decúbito lateral N=62 (30,24%) e a menos frequente cócoras N=1 (0,45%). O uso da banqueta de parto corresponde a N=45 (39,47%) das lacerações de 2° grau, sendo pouco mais de um terço de todas as lacerações de 2° grau comparadas às  demais posições. As laceração de 3° e 4° corresponderam a menos de 1% de todas as lacerações, duas ocorrendo com o uso de banqueta de parto e uma em quatro apoios. Além disso, ocorreu uma única laceração em colo uterino também na banqueta de parto.

Tabela 3. Posição de parto x grau da laceração

Posição

Laceração (N (%))

       

1° Grau

2° Grau

3° e 4° Graus

 

De colo

Banqueta de parto

55 (26,82)

45 (39,47)

2 (66,67)

 

1 (100)

Cócoras

1 (0,45)

2 (1,76)

0 (0)

 

0 (0)

Decúbito lateral

62 (30,24)

21 (18,42)

0 (0)

 

0 (0)

Quatro apoios

37 (18,05)

22 (19,30)

1 (33,33)

 

0 (0)

Litotomia

4 (1,95)

1 (0,88)

0 (0)

 

0 (0)

Semi sentada

46 (22,44)

23 (20,17)

0 (0)

 

0 (0)

 

Total

205

114

3

1

DISCUSSÃO

Estudos evidenciam que posições verticalizadas funcionam como intervenções não medicamentosas que corroboram para o progresso do parto, auxiliando nos prognósticos favoráveis e diminuindo o tempo do período expulsivo, favorecendo experiências maternas positivas1. No estudo realizado, 354 pacientes adotaram posições verticalizadas e 145 posições não verticalizadas. Considerando que essas mulheres adotaram posições de maior conforto ou foram estimuladas pela equipe que as assistia, o que comprova que a posição materna está relacionada com o movimento fisiológico do próprio corpo feminino, o qual viabiliza a descida fetal de forma progressiva.

Diretrizes baseadas em evidências incentivam a movimentação das parturientes e a adoção de qualquer posição que considerem mais confortável durante o trabalho de parto e parto, exceto posições horizontalizadas devido à desfavorável descida fetal. A Organização Mundial da Saúde recomendou a posição vertical desde 1996 e afirmou que as mulheres deveriam escolher a posição materna de acordo com sua preferência e conforto. Posições maternas adequadas podem melhorar o senso de controle materno facilitando assim o enfrentamento do trabalho de parto e reduzindo as implicações psicológicas negativas 11,15.

Esse estudo evidenciou que as lacerações de 1º e 2º grau são as mais frequentes (98,76%), independentemente da posição adotada pela paciente. As lacerações de 1º grau, que acometem somente tecidos superficiais (pele e mucosa), correspondem a 63,46% do total; e muitas vezes não necessitam de reparos, exceto em situações de anatomia comprometida ou sangramentos. Já as lacerações de 2º grau, que podem envolver a fáscia e tecidos musculares superficiais e profundos correspondem a 35,3%, as quais geralmente são rafiadas. 

A episiotomia, tema controverso quando se trata de lacerações perineais e prática obstétrica atualmente não recomendada, é uma incisão que abrange pele, mucosa vaginal, aponeurose superficial do períneo e fibras dos músculos bulbocavernoso e do transverso superficial do períneo e algumas vezes, fibras internas do elevador do ânus. Portanto, quando se compara lacerações perineais espontâneas e episiotomias, pode-se afirmar que estas últimas são minimamente lacerações de 2ºgrau intencionalmente provocadas. Este estudo revelou que a grande maioria das lacerações são de 1ºgrau, o que comprova não haver evidências confiáveis de que o uso liberal ou rotineiro de episiotomia tenha um efetivo benefício, com indícios claros de danos à paciente ¹³. 

Dentre as lacerações avaliadas e seus respectivos graus, sabe-se que as lacerações estão relacionadas com diversas variáveis, dentre as quais a fragilidade ou força muscular perineal, a velocidade da descida fetal, a paridade, o manejo do profissional que realiza a assistência ao parto, a posição de escolha da mulher e outros determinantes intrínsecos e extrínsecos relacionado ao processo de nascimento10. Avaliando apenas a variável posição adotada durante o período expulsivo que corrobora para a integridade perineal, o fato da posição semi-sentada apresentar a maior porcentagem (37,50%) de integridade perineal, pode estar relacionada à lenta descida do polo cefálico fetal devido à contra direção do vetor gravidade. Este dado entra em consonância com outros estudos que trazem as posições horizontalizadas com menores números de lacerações, porém relacionados a maior tempo de trabalho de parto. 

A revisão da Cochrane descreveu que as posições verticais estavam associadas com a elevação da ocorrência de lacerações perineais de segundo grau (RR 1,20, IC 95% 1,00–1,44), quando em comparação com a posição supina durante o período expulsivo. Contudo, foi possível estimar o período de trabalho de parto superior em mulheres que adoraram as posições horizontalizadas. As posições horizontalizadas adotadas durante as contações exige que a mulher realize uma força contrária a gravidade e coloca o feto em um ângulo de movimentação desfavorável em relação à pelve materna 11, 16.

Dentre as posições verticalizadas mais adotadas temos o uso da banqueta em primeiro lugar. Contudo, o uso da banqueta se mostrou a posição com o maior número de lacerações, correspondendo cerca de um terço do total das lacerações dentro das posições verticalizadas. Deste modo, a posição de maior conforto materno parece ser com o uso da banqueta de parto, pela facilidade de adotar a posição (semelhante a ficar sentada em um vaso sanitário), abertura favorável da pelve materna e pela facilidade da descida fetal. Entretanto, a descida fetal rápida é um dos fatores que mais contribuem para o acometimento do tecido perineal, podendo causar lacerações de diferentes graus a depender da pressão exercida nessas estruturas musculares.

A posição verticalizada sentada com auxílio de banqueta é mais popular em países ocidentais desenvolvidos do que nos países asiáticos. Um estudo francês apontou que a posição sentada com assento de parto (banqueta) foi a posição materna mais comum durante o período expulsivo (30,3%), como também ocorreu em um estudo sueco, (45,1%). No entanto, há um aumento do risco de lacerações com acometimento esfincteriano entre multíparas (RR ajustado 1,36, IC 95%: 1,03–1,80) 11.

Neste estudo, mulheres que tiveram seus partos em litotomia provavelmente chegaram  na Unidade de saúde em trabalho de parto avançado, não havendo tempo hábil de transferí-las para o leito PPP (pré-parto, parto, pós parto). Desse modo, o espaço do consultório reduzido e a maca fixa foram relevantes para a adoção da posição litotomica. 

A posição de quatro apoios não evidenciou diferenças entre os graus de laceração, quando comparados 1º e 2º graus, sendo a terceira posição verticalizada mais adotada pelas parturientes. Já a posição de cócoras foi a posição menos adotada no período expulsivo, com taxas de lacerações bastante reduzidas, dificultando conclusões acerca da influência da posição em relação à integridade tissular. Essa posição costuma ser menos adotada em função do seu desconhecimento pela paciente10. Há também empecilhos impostos pela equipe devido às dificuldades ergonômicas durante a assistência. Cabe ressaltar que ambas as posições contemplam vantagens referentes à verticalização do corpo materno e devem ser estimuladas pela equipe assistencial, uma vez que essa intervenção não medicamentosa favorece o protagonismo materno. 

Uma revisão sistemática mostrou que posições que mantêm o sacro livre podem reduzir a duração do período expulsivo em 12 a 21 minutos. A redução na duração do segundo estágio traz vantagens tanto para a parturiente quanto para o neonato, reduzindo as intervenções desnecessárias e maus desfechos, como as desacelerações da frequência cardíaca fetal, hipóxia neonatal e acidose metabólica. De outra forma, a redução na segunda fase do trabalho de parto pode causar traumas perineais maternos devido à rápida expulsão da cabeça fetal 12,17.

O acometimento do períneo é dividido em graus a depender das estruturas envolvidas na laceração e apresenta uma série de repercussões futuras para a mulher, as quais serão vivenciadas no puerpério, tais como desconforto e dor perineal, dispareunia, além dos riscos aumentados de infecção materna e até mesmo disfunções musculares esfinctorianas. Dentre as lacerações que acometem o complexo esfincteriano anal, um estudo revelou que 17% das mulheres que tiveram o comprometimento dessa região apresentaram algum grau de incontinência fecal 13,14.  Na amostra da Casa de Parto deste estudo ocorreram somente três lacerações de terceiro e quarto graus, todas em posições verticalizadas (banqueta de parto e quatro apoios), não sendo conhecidas as repercussões a médio e longo prazo, uma vez que estas são removidas para o hospital de referência para avaliação e conduta. 

Considerando que a laceração pode causar uma má experiência puerperal, é aconselhável que o profissional responsável por prestar a assistência ao parto tenha competência técnico-científica para favorecer uma descida fetal gradativa, evitando assim danos tissulares. Alguns estudos vêm sendo realizados, e várias técnicas sendo apontadas na tentativa de prevenir lacerações ou evitar lacerações graves, entre elas: o exercício físico moderado na gravidez, no mínimo três vezes por semana; realizar massagem perineal, desde a 30ª semana de gestação; maior mobilidade ao longo do trabalho de parto; incentivar a mulher ao puxo espontâneo no período expulsivo; promover a restrição da manipulação perineal; proceder à aplicação de compressas quentes no períneo, durante o segundo período do trabalho de parto; preferir o apoio perineal simples a manobra de Ritgen (compressão do polo cefálico durante o período expulsivo). Entretanto, ainda são poucos os estudos e evidências científicas para respaldar e incentivar estas técnicas nos serviços de saúde18.

CONCLUSÃO

As posições verticalizadas (auxílio da banqueta de parto, decúbito lateral e quatro apoios) foram as mais utilizadas pelas parturientes da amostra deste estudo. Entretanto, verificou-se que as mesmas vêm acompanhadas de fatores de risco para lacerações perineais em diferentes graus, sendo a maioria de 1° e 2° graus.

As lacerações perineais associadas à verticalização materna no período expulsivo estão relacionadas com a rápida descida do polo cefálico fetal, apesar de associadas a partos menos laboriosos. A posição mais adotada pelas parturientes foi verticalizada com auxílio da banqueta de parto, entretanto, apresentando maiores taxas de lacrações. Deste modo, a escolha da mulher em adotar posições de maior conforto e possibilidade de movimentação sacral demonstrou uma progressão no trabalho de parto mais favorável, estimulando o protagonismo da mulher no parto. 

Cabe lembrar que não somente a posição de parto, mas também outras variáveis não verificadas neste estudo, também podem estar associadas à ocorrência de lacerações, tais como idade materna, paridade, anatomia perineal, uso de ocitocina, partos instrumentalizados, variações da posição fetal, procidência de membros, entre outros. Portanto, outros estudos devem ser estimulados para a melhor e mais abrangente compreensão dos diferentes determinantes que levam a desintegridade tissular perineal no parto.

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