TRATAMENTO DE LESÕES DE DIFÍCIL CICATRIZAÇÃO EM MEMBROS SUPERIORES COM BANDAGEM DE ÓXIDO DE ZINCO
TRATAMENTO DE LESÕES DE DIFÍCIL CICATRIZAÇÃO EM MEMBROS SUPERIORES COM BANDAGEM DE ÓXIDO DE ZINCO
TREATMENT OF HARD-TO-HEAL UPPER LIMB WOUNDS WITH ZINC OXIDE BANDAGE
TRATAMIENTO DE HERIDAS DE DIFÍCIL CICATRIZACIÓN EN MIEMBROS SUPERIORES CON VENDAJE DE ÓXIDO DE ZINC
Autores:
Maria Madalena Jorge de Oliveira do Amaral - Especialista em Enfermagem Dermatológica na Faculdade Redentor, Campos dos Goytacazes, RJ, Brasil. Especialista em Enfermagem do Trabalho na Universidade Salgado de Oliveira, Campos dos Goytacazes, RJ, Brasil. ORCID: 0009 0002 7485 5880
Marilzete Teles de Almeida - Mestre Profissionalizante em Ensino de Ciências da Saúde Ambiente pelo Centro Universitário Plínio Leite (UNIPLI). Faculdade de Medicina de Campos (FMC), Departamento de Enfermagem, Campos dos Goytacazes, RJ, Brasil. ORCID: 0009-0002-5177-7226
RESUMO
Este estudo avaliou um novo protocolo para tratar feridas de difícil cicatrização em membros superiores, utilizando produtos com polihexametileno biguanida 0,2% e associações com bandagem de óxido de zinco, em ambulatórios em Campos dos Goytacazes e no Hospital Santa Casa de Misericórdia de São João da Barra, RJ. Dez pacientes com feridas graves nos membros superiores foram selecionados com base em critérios específicos. Os pacientes apresentavam feridas graves, com comprometimento na cicatrização. Os curativos incluíram sabonete com polihexametileno biguanida 0,2% e associações com bandagem impregnada com óxido de zinco de Unna, trocados a cada 4-5 dias. O tratamento mostrou-se eficaz, reduzindo edema e promovendo a reabsorção do líquido intersticial pela rede linfática, o que melhorou a circulação sanguínea local e acelerou a cicatrização. Os resultados indicam que o protocolo com bandagem de óxido de zinco de Unna é viável para centros de tratamento de feridas de difícil cicatrização.
Descritores: Ferida. Óxido de zinco. Membro Superior. Cicatrização. Cuidados de Enfermagem.
ABSTRACT
This study evaluated a new protocol for treating difficult-to-heal wound on upper limbs, using products with polyhexamethylene biguanide 0.2 % and combinations with zinc oxide bandages, in outpatient clinics in Campos dos Goytacazes and at the Santa Casa de Misericórdia Hospital in São João da Barra, RJ. Ten patients with severe wounds on the upper limbs were selected based on specific criteria. The patients had severe wounds with impaired healing. The dressings included soap with polyhexamethylene biguanide 0.2 % and combinations with bandages impregnated with Unna’s zinc oxide, changed every 4-5 days. The treatment proved to be effective, reducing edema and promoting the reabsorption of interstitial fluid by the lymphatic network, which improved local blood circulation and accelerated healing. The results indicate that the protocol with Unna’s zinc oxide bandage is viable for centers treating difficult-to-heal wounds.
DESCRIPTORS: Wound, Zinc oxide, Upper limb, Healing, Nursing care.
RESUMEN
Este estudio evaluó un nuevo protocolo para el tratamiento de heridas de difícil cicatrización en los miembros superiores, utilizando productos con polihexametileno biguanida al 0,2% y combinaciones con vendajes de óxido de zinc, en consultorios ambulatorios de Campos dos Goytacazes y del Hospital Santa Casa de Misericórdia de São João da Barra, RJ. Se seleccionaron diez pacientes con heridas graves en las extremidades superiores según criterios específicos. Los pacientes presentaban heridas graves con problemas de cicatrización. Los apósitos incluyeron jabón con polihexametileno biguanida al 0,2% y asociaciones con vendaje impregnado con óxido de zinc de Unna, cambiados cada 4-5 días. El tratamiento demostró ser eficaz, reduciendo el edema y favoreciendo la reabsorción del líquido intersticial por la red linfática, mejorando la circulación sanguínea local y acelerando la curación. Los resultados indican que el protocolo de vendaje con óxido de zinc de Unna es viable para centros que tratan heridas de difícil curación.
DECRIPTORES: Herida, Óxido de zinc, Miembro Superior, Cicatrización, Cuidado de enfermería.
Tipo de artigo: Artigo Original
Recebido: 03/07/2024 Aprovado: 16/07/2024
INTRODUÇÃO
Feridas são alterações anormais ou funcionais de um tecido biológico, caracterizadas pela quebra da integridade do tegumento cutâneo, que inclui pele, mucosas e tecidos de órgãos 1. Diversos fatores podem desencadear feridas, como trauma físico, agentes patogênicos, processos inflamatórios, exposição a substâncias e distúrbios genéticos 2. As feridas são categorizadas pela etiologia, morfologia, comprometimento estrutural, estágio da infecção, complexidade e duração, sendo classificadas como agudas ou crônicas 3. Feridas agudas resultam de cirurgias ou traumas, com reparação geralmente dentro do tempo esperado, enquanto feridas crônicas são de longa duração e de difícil reparação, frequentemente causadas por inflamação persistente, comorbidades ou lesões mal curadas, como as diabéticas, vasculogênicas e neoplásicas 4.
Uma das principais causas de lesões complexas são as comorbidades, como câncer, doenças cardíacas, hipertensão, diabetes e problemas vasculares, cuja incidência aumenta com o envelhecimento. Com o aumento da expectativa de vida, houve um crescimento na incidência dessas doenças 5. Outras causas comuns de lesões complexas incluem o extravasamento devido ao uso de drogas, especialmente em tratamentos quimioterápicos, onde o medicamento pode sair do vaso sanguíneo, causando vesículas e destruição tecidual 6.
As feridas de difícil cicatrização afetam negativamente a qualidade de vida do indivíduo e representam uma preocupação de saúde pública, exigindo intervenções adequadas e de baixo custo 7. Com o aumento da expectativa de vida, espera-se um crescimento na demanda por tratamentos eficazes de lesões complexas, desafiando o sistema de saúde. O tratamento dessas feridas envolve diversas etapas, considerando causa, tempo de existência, infecção, dor, edema, extensão e profundidade da lesão, características do leito da ferida, pele ao redor e exsudato. A avaliação periódica da ferida é essencial para acompanhar a evolução do processo cicatricial e a eficácia da cobertura utilizada 8.
A cicatrização de feridas é um processo complexo que envolve várias fases: hemostasia, inflamação, proliferação celular e reparação total do tecido danificado 9. A hemostasia controla o sangramento e limita a propagação de microrganismos por meio de constrição vascular, agregação de plaquetas e formação de coágulos de fibrina. A reparação tecidual envolve a formação de tecido de granulação, deposição de matriz extracelular e, finalmente, sua remodelação 10.
A terapia tópica é o conjunto de cuidados aplicados diretamente na ferida, incluindo limpeza, desbridamento e cobertura 11. A limpeza remove restos celulares, tecidos necróticos, materiais estranhos, exsudato e resíduos de agentes tópicos para promover e preservar o tecido de granulação. A cobertura deve ser impermeável à água e fluidos, fácil de aplicar, auxiliar na hemostasia, promover desbridamento, absorver exsudato e aliviar a dor. Estes cuidados são essenciais para a eficácia do tratamento e a promoção da cicatrização 12.
Os agentes de limpeza, como soluções antimicrobianas e antissépticas, incluindo sabonete PHMB 0.2% e soluções de PHMB 0.2%, atuam na remoção de detritos e redução de riscos de infecção. O uso de água estéril de injeção para limpeza de lesões é recomendado para diminuir o risco de traumatismo tecidual e inflamação, proporcionando um ambiente de pH acidificado 13. É importante considerar o tipo e causa da lesão, pois a presença de sangue ou tecido necrótico pode reduzir a eficácia desses agentes 14.
A PHMB 0.2%, combinada com outros componentes como ácidos graxos, bisabolol e bálsamo de copaíba, é eficaz para preparar o leito da ferida e tratar lesões, atuando contra uma ampla gama de patógenos, incluindo bactérias gram-positivas, gram-negativas, fungos, leveduras e esporos 15. Sendo não citotóxica, a PHMB 0.2% pode ser utilizada na assepsia da pele íntegra e no tratamento de feridas limpas ou infectadas, reduzindo a inflamação e proporcionando condições favoráveis para a cicatrização. A composição sintética da PHMB, semelhante aos peptídeos antimicrobianos do sistema imune, confere-lhe ação contra bactérias, vírus e fungos, tornando-a um potente agente antimicrobiano para o tratamento de lesões 16.
O desbridamento é essencial para limpar a lesão, removendo tecido desvitalizado e materiais estranhos, reduzindo a contaminação bacteriana e preparando a lesão para cicatrização. A etiologia da lesão, sua localização anatômica e as técnicas cirúrgicas utilizadas influenciam o desbridamento e a cicatrização 17.
A cobertura, última etapa da terapia tópica, protege a lesão e ajuda na cicatrização. As coberturas podem ser passivas (proteção), hidroativas (mantêm o ambiente úmido) ou bioativas (estimulam a cicatrização), sendo escolhidas conforme o tipo de lesão 7. A bandagem com óxido de zinco, usada desde 1896, é vantajosa para tratar lesões cutâneas por sua ação hidratante, anti-inflamatória e de aceleração da cicatrização, sendo indicada para úlceras venosas em membros inferiores 18.
Visto isso, o objetivo desse estudo foi avaliar um novo protocolo de tratamento de feridas de difícil cicatrização em membros superiores, e evolução da cicatrização, com a utilização de produtos impregnados com poli hexa metil biguanida (PHMB) 0.2% e associações agregado a bandagem com óxido de zinco, na técnica de enfaixamento adaptada, em ambulatório de tratamento de lesões, no Município de Campos dos Goytacazes, RJ, e hospital Santa Casa de Misericórdia de São João da Barra, RJ.
MÉTODO
ASPECTOS ÉTICOS
O presente estudo foi submetido e aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa sob o parecer número 4997.310. Todo o processo e condução do trabalho foi realizado de acordo com os princípios éticos de acordo com a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde e a Resolução 510/16 em relação as normas aplicáveis a pesquisa em Ciências Humanas e Sociais. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
POPULAÇÃO E CRITÉRIOS DE SELEÇÃO
O estudo foi realizado em um ambulatório especializado em tratamento de lesões dérmicas e pé diabéticos no Município de Campos dos Goytacazes e Hospital Santa Casa de Misericórdia de São João da Barra, no estado do Rio de Janeiro.
A população de estudo foi constituída de 10 pacientes femininos, de 32 a 86 anos, com lesão nos membros superiores esquerdo ou direito (Tabela 1). Todas as pacientes apresentavam pelo menos uma comorbidade (diabetes, hipertensão, cardiopatias), com exceção de uma paciente. Os critérios de inclusão incluíram pacientes com diagnóstico de lesões causadas por diferentes etiologias. Em relação aos critérios de exclusão destacam-se pacientes que apresentaram pulso radial não palpável ou que não fossem capazes de continuar a terapia.
Tabela 1: Descrição dos pacientes do presente estudo. Pacientes (n=10) participantes do estudo, com lesões complexas em membros superiores. Pacientes apresentavam comorbidade, de 32 a 86 anos, com lesões ocasionados por diferentes causas. *s.c: sem comorbidade.
Paciente |
Sexo |
Idade |
Comorbidade |
Causa da lesão |
Local da lesão |
Duração do tratamento |
1 |
Feminino |
86 anos |
Diabetes e cardiopatia |
Extravasamento dobutamina |
Membro superior direito |
60 dias |
2 |
Feminino |
56 anos |
Diabetes e obesidade |
Amputação por isquemia por trombose venosa periférica |
Membro superior direito |
50 dias |
3 |
Feminino |
49 anos |
Diabetes |
Lesão Traumática por arma contundente |
Membro superior esquerdo |
52 dias |
4 |
Feminino |
53 anos |
Diabetes, hipertensão e neoplasia mamária |
Esporotricose |
Membro superior esquerdo |
52 dias |
5 |
Feminino |
64 anos |
Diabetes |
Lesão traumática com corpo estranho |
Membro superior direito |
66 dias |
6 |
Feminino |
43 anos |
Diabetes, hipertensão e cardiopatia |
Mordedura de cão |
Membro superior direito |
- |
7 |
Feminino |
56 anos |
Diabetes, cardiopatia |
Lesão traumática e amputação |
Membro superior esquerdo |
65 dias |
8 |
Feminino |
60 anos |
Diabetes, hipertensão e cardiopatia |
Lesão traumática com perfurocortante e amputação |
Membro superior direito |
59 dias |
9 |
Feminino |
32 anos |
Diabetes e obesidade |
Trombose isquêmica e amputação |
Membro superior esquerdo |
7 dias |
10 |
Feminino |
34 anos |
s.c |
Trombose e amputação |
Membro superior esquerdo |
27 dias |
TRATAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS
Todos os procedimentos foram realizados por profissionais de enfermagem, desde a avaliação ao tratamento das lesões dermatológicas. Para avaliação do protocolo de tratamento de lesões complexas de membros superiores com PHMB à 0.2% e associações e o uso de bandagem de óxido de zinco. Em primeiro lugar foi feito o desbridamento instrumental nas lesões com tecidos inviáveis que dificultaram a boa evolução da lesão.
A seguir, a limpeza das feridas foi realizada com 500 – 1000 ml de água estéril de injeção em jato, irrigando abundantemente o leito da ferida, e realizando uma fricção leve com sabonete antimicrobiano à base de PHMB à 0.2% (Gigaderm®; Walkmed). Posteriormente, o ferimento fica embebido em gaze uma solução PHMB (Aquasept plus 0.2%®; Walkmed), durante 10 minutos.
Após isso, os primeiros curativos utilizaram a gaze com antimicrobiano impregnada com PHMB (Kerlix®; Covidien), para posteriormente aplicação da bandagem saturada de óxido de zinco. Na aplicação da terapia, a bandagem foi aplicada iniciando pelos quirodáctilos em técnica de sobreposição de enfaixamento até a região cubital, quando a localização da lesão ocorrer entre o dorso da mão e antebraço. Porém essa aplicação foi reajustada quando a localização da lesão ocorreu na região do braço, nesse caso a técnica de sobreposição iniciou-se desde os artelhos passando pelos punhos, antebraço, braço, finalizando na região axilar.
As bandagens foram utilizadas na terapia e seguiram as características de compressão 18 mmHg, e concentração de 10% de óxido de zinco, goma acácia, glicerol, óleo de rícino e água deionizada (Bota de unna; Lohamann®). A troca da bandagem foi realizado a cada 4 a 5 dias, até o momento que o exsudato não foi mais visível, resultando na cicatrização da lesão. Para o curativo foi utilizado gaze algodoada estéril, em cima da bandagem para absorver o exsudato liberado pela ferida, sendo fixado com enfaixamento de atadura crepom, sendo a mesma trocada diariamente ou conforme o grau de absorção da umidade no mesmo.
RESULTADOS
Para analisar o protocolo de tratamento de lesões complexas em membros superiores com PHMB 0,2% e associações e bandagem de óxido de zinco, 10 pacientes com lesões graves de difícil cicatrização foram acompanhados. As causas das lesões incluíam extravasamento de medicações, trombose, lesões de origem animal e lesões traumáticas, todas com complicações na cicatrização devido a comorbidades pré-existentes. Apesar das diferentes causas das lesões/feridas, todas as pacientes apresentaram complicações nas cicatrizações devido a comorbidades pré diagnosticadas. Os resultados mostraram que 90% dos pacientes tinham diabetes mellitus, 40% cardiopatia, 30% hipertensão arterial e 20% obesidade.
De modo geral, o tratamento das lesões complexas nos membros superiores teve uma duração média de 47 dias, variando conforme a gravidade das lesões. Observou-se uma redução significativa do edema, devido à reabsorção do líquido intersticial pelo sistema linfático, o que melhorou a circulação sanguínea e acelerou a cicatrização. Os resultados mostram que o protocolo utilizando PHMB 0,2% e associações e a bandagem de óxido de zinco foi eficaz na maioria dos pacientes, demonstrando ser uma abordagem viável para o tratamento de lesões complexas.
A paciente 1, que sofreu uma lesão por extravasamento do medicamento cloridrato de dobutamina venoso, com histórico de diabetes e cardiopatia. A necrose tissular resultante exigiu desbridamento cirúrgico, e a bandagem primária foi trocada a cada 4 dias (Figura 1B). O tratamento durou 60 dias, resultando na completa cicatrização da lesão (Figura 1D).
Figura 1. Evolução do tratamento com bandagem de óxido de zinco na Paciente 1. (A) antes de iniciar o tratamento proposto; (B) durante o tratamento; (C) após 60 dias de tratamento.
Dos 10 pacientes acompanhados, quatro apresentaram lesões complexas no membro superior devido a traumas (Figura 2). A paciente 5, diabética, teve um abscesso na mão direita causado por penetração de objeto estranho (Figura 2A-E). Com a aplicação da bandagem de óxido de zinco por 66 dias, houve uma melhora significativa na cicatrização da lesão. A paciente 3, também diabética, sofreu uma lesão traumática no membro superior esquerdo, mas desenvolveu uma infecção após 4 dias, necessitando desbridamento cirúrgico. Apesar da complicação, a troca de bandagens a cada 4 dias ao longo de 52 dias resultou em uma cicatrização satisfatória (Figura 2F-J).
A paciente 8, diabética, hipertensiva e cardiopata, teve uma lesão perfurocortante na mão direita, levando à amputação do 2º e 3º quirodáctilo (Figura 2K-O). Após 59 dias de tratamento com a bandagem compressiva e uso de ciprofloxacino (500 mg, 12/12 horas por 14 dia), houve melhora significativa da lesão. No entanto, a paciente 7, diabética, não teve um resultado satisfatório. Com um abscesso na mão esquerda por trauma, foi submetida a desbridamento cirúrgico e, após sinais de isquemia, precisou amputar o quirodáctilo (Figura 2P-T). O tratamento com bandagem durou 65 dias, mas devido à amputação, o protocolo não foi totalmente eficaz. Esses resultados mostram que, embora o protocolo tenha sido eficaz na maioria dos casos, houve exceções devido à gravidade das lesões e comorbidades dos pacientes.
Figura 2. Evolução do tratamento com bandagem de óxido de zinco nos pacientes com lesão traumática. (A) antes de iniciar o tratamento do paciente 3; (B, C, D) durante o tratamento do paciente 3; (E) após o tratamento do paciente 3; (F) antes de iniciar o tratamento do paciente 5; (G, H, I) durante o tratamento do paciente 5; (J) após o tratamento do paciente 5; (K) antes de iniciar o tratamento do paciente 7; (L, M, N) durante o tratamento do paciente 7; (O) após o tratamento do paciente 7; (P) antes de iniciar o tratamento do paciente 8; (Q, R, S) durante o tratamento do paciente 8; (T) após o tratamento do paciente 8.
A trombose isquêmica foi observada em 3 das 10 pacientes tratadas com bandagem de óxido de zinco e produtos com PHMB 0.2% e associações (Figura 3). A paciente 2, com diabetes e obesidade, sofreu uma amputação do membro superior direito devido a uma trombose venosa periférica (Figura 3A-C). O tratamento com bandagem de óxido de zinco e PHMB 0.2% e associações foi realizado a cada 5 dias, resultando em cicatrização completa após 50 dias.
A paciente 9, diabética e com obesidade, apresentou trombose no membro superior esquerdo (Figura 3D-F) e foi tratada com bandagem de óxido de zinco por 7 dias, resultando em cicatrização significativa. Em contraste, a paciente 10, sem comorbidades, desenvolveu trombose no membro superior esquerdo após a vacinação contra COVID-19 (Figura 3G-I), sofrendo necrose tissular e amputação dos 2º e 3º quirodáctilos. Seu tratamento com bandagem compressiva durou 27 dias, levando a uma melhora na cicatrização.
Figura 3. Evolução do tratamento com bandagem de óxido de zinco nos pacientes com lesão por trombose isquêmica. (A) antes de iniciar o tratamento do paciente 2; (B) durante o tratamento do paciente 2; (C) após o tratamento do paciente 2; (D) antes de iniciar o tratamento do paciente 9; (E) durante o tratamento do paciente 9; (F) após o tratamento do paciente 9; (G) antes de iniciar o tratamento do paciente 10; (H) durante o tratamento do paciente 10; (I) após o tratamento do paciente 10.
Por fim, duas pacientes apresentaram lesões relacionadas a animais (Figura 4). A paciente 4, diabética e hipertensa, foi diagnosticada com esporotricose no membro superior (Figura 4A-C). Com alto grau de exsudato, iniciou-se tratamento com bandagem, trocando o curativo a cada 4 dias e a cobertura diariamente. Após 52 dias, observou-se uma melhora significativa da lesão. A paciente 6 apresentou uma lesão na mão direita causada por mordedura de cão, com abscesso necessitando desbridamento cirúrgico (Figura 4D-F). Após a alta, compareceu ao centro de tratamento para curativos, mostrando boa evolução da ferida. No entanto, a paciente sofreu um infarto e faleceu antes de concluir o tratamento.
Figura 4. Acompanhamento do tratamento com bandagem de óxido de zinco mais PHMB à 0.2% e associações nos pacientes com ferida ocasionado por origem animal. Paciente 4 antes do tratamento (A), durante (B), e após 52 dias de tratamento (C). Paciente 6 antes do tratamento com bandagem de óxido de zinco (D), durante (E-F), não sendo possível acompanhar até o final do tratamento por motivo de óbito.
DISCUSSÃO
Muitos fatores influenciam na cicatrização de feridas incluindo etiologia, tamanho, profundidade, localização, idade da pessoa, história de doença pregressa local e sistêmica, além do histórico familiar e componentes genéticos. No presente estudo 90% dos pacientes apresentavam comorbidades pré-existentes. A grande maioria das feridas crônicas, ocorrem em indivíduos que apresentam alguma comorbidade como diabetes, déficits vasculares, hipertensão e doença renal crônica. A maior incidência de lesões ocorre devido a diabetes ou traumas 19.
A prevalência de comorbidades aumenta com a idade, o que contribui para uma maior incidência de feridas crônicas, especialmente entre a população idosa. Nos Estados Unidos, estima-se que 3% da população com mais de 65 anos e 2% da população total sejam afetadas por lesões crônicas 19,20. No estudo, 60% dos pacientes procuraram tratamento para lesões crônicas causadas por trauma, com a maioria desses pacientes também diagnosticados com diabetes, o que agravou as feridas e interferiu na cicatrização. Dos seis pacientes com lesões traumáticas, cinco tinham diabetes.
As pacientes mais jovens (nº 9 e 10) apresentaram tempos de cicatrização significativamente menores, de 7 e 27 dias, respectivamente, em comparação com os outros pacientes. O estudo observou uma média de cicatrização de 47 dias, alinhado com um estudo anterior que reportou tempos de cicatrização entre 42 e 56 dias usando bandagem de óxido de zinco para lesões nos membros inferiores 21. Esses resultados destacam a influência da idade e do diabetes na cicatrização de feridas.
Um estudo no Reino Unido, entre 2012 e 2018, avaliou a prevalência de feridas em 3.000 pacientes de uma coorte de 174.569, com idade média de 57,9 anos, similar à média de 55 anos do nosso estudo 22. Nesse estudo, 95% dos pacientes tinham ao menos uma comorbidade antes do início da ferida, sendo 57% diagnosticados com diabetes. De forma semelhante, 90% dos pacientes do nosso estudo apresentavam comorbidades prévias, e 90% deles tinham diabetes mellitus.
O tratamento correto é crucial para a cicatrização de feridas, podendo acelerar ou retardar o processo. A escolha adequada do curativo é fundamental para proteger a ferida e prevenir infecções, levando em conta o tipo de lesão e as características individuais do paciente 19. A limpeza com o antisséptico tópico PHMB 0.2% e associações é amplamente utilizada para combater infecções em feridas devido à sua alta estabilidade e eficácia antibacteriana contra bactérias Gram-positivas e Gram-negativas. Estudos demonstram que o PHMB 0.2% e associações promove a cicatrização com baixa citotoxicidade, favorecendo a granulação do tecido no leito da ferida 16. Comparativamente, um estudo in vitro avaliou a eficácia de curativos contendo agentes antimicrobianos, como PHMB e prata revestida em fibras de náilon, constatando que esses curativos reduziram significativamente as infecções em feridas cutâneas 23.
A bota de Unna, com óxido de zinco, é amplamente utilizada para tratar edemas linfáticos e estases venosas, melhorando o fluxo venoso e mantendo um ambiente úmido para cicatrização. O óxido de zinco presente nesta bandagem possui propriedades antimicrobianas e anti-inflamatórias, além de promover a cicatrização através da reepitelização 18. Um estudo de Moraes et al (2000) 24 demonstraram que a suplementação oral com zinco e cromo induziram melhor cicatrização de lesões cutâneas em ratos diabéticos. Além disso, o zinco é um elemento presente nas moléculas de insulina, o que apresenta efeito na reparação tecidual, sendo uma vantagem para pacientes diabéticos durante o processo de cicatrização tecidual 24.
Um estudo prévio demonstrou que a bota de Unna com óxido de zinco é mais eficaz na cicatrização de feridas cutâneas do que curativos úmidos e não compressivos 25. Esta bandagem oferece uma interface de longa duração que não necessita de trocas diárias, permitindo a formação contínua de fibroblastos e um controle eficaz do exsudato, com substituições apenas das coberturas secundárias.
Para feridas de difícil cicatrização nos membros superiores, o uso de bandagem impregnada com óxido de zinco é essencial para evitar complicações como exposição de tendões, músculos e ossos, reduzindo o risco de infecções e possível amputação. No entanto, um desafio significativo no tratamento é garantir o acompanhamento regular dos pacientes para as trocas de curativos, o que pode influenciar diretamente no tempo de cicatrização da lesão 21. Embora no presente estudo não tenhamos observado problemas com a adesão ao tratamento com bandagem de óxido de zinco, alguns pacientes enfrentaram dificuldades financeiras e de acesso ao ambulatório para as consultas.
O presente estudo revelou resultados significativos na cicatrização de lesões em membros superiores utilizando bandagem de óxido de zinco e produtos com PHMB à 0.2% e associações, uma abordagem inovadora que difere dos estudos tradicionais que focam na bota de Unna para membros inferiores. Este estudo propõe uma nova aplicabilidade da bandagem com óxido de zinco em feridas complexas de membros superiores, independentemente da etiologia das lesões. Esses achados são essenciais para aprimorar o tratamento de feridas, oferecendo insights valiosos para profissionais de saúde e pacientes, e sugerem a necessidade de novos estudos para ampliar o uso da bandagem com óxido de zinco e melhorar as práticas clínicas no manejo de lesões de difícil cicatrização em membros superiores.
CONCLUSÃO
A bandagem de óxido de zinco em membros superiores demonstrou eficácia na redução do edema e na melhora da circulação local, favorecendo a cicatrização de feridas crônicas cutâneas. Esses achados indicam que o tratamento pode ser uma opção viável para centros especializados em feridas crônicas em membros superiores.
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