A PERCEÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE NO CUMPRIMENTO DA DIRETIVA ANTECIPADA DE VONTADE 

A PERCEÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE NO CUMPRIMENTO DA DIRETIVA ANTECIPADA DE VONTADE 

THE PERCEPTION OF HEALTH PROFESSIONALS IN COMPLIANCE WITH ADVANCE DIRECTIVES

LA PERCEPCIÓN DE LOS PROFESIONALES DE LA SALUD EN EL CUMPLIMIENTO DE LA DIRECTIVA ANTICIPADA DE VOLUNTAD

Autores

Lúcia Santos - Mestre em Enfermagem Médico-cirúrgica; Licenciada em Enfermagem – Especialidade em Enfermagem Médico-Cirúrgica; Enfermeira formadora serviço de medicina 1 piso 6 na unidade de Saúde do Alto Minho, Hospital de Santa Luzia – Viana do Castelo, Portugal.

Manuela Cerqueira - Professora Adjunta do Instituto Politécnico de Viana do Castelo - Escola Superior de Saúde, Doutora em Ciências de Enfermagem, Mestre em Cuidados Paliativos, Especialista em Enfermagem na Comunidade. Especialista em Enfermagem à Pessoa em Situação Paliativa. Nursing UICISA: E Cluster of the Health School of the Polytechnic Institute of Viana do Castelo à Health Sciences Research Unit: Nursing UICISA: E Nursing school of Coimbra – Portugal

RESUMO:

Objetivo: conhecer a perceção dos profissionais de saúde no cumprimento da Diretiva Antecipada de Vontade (DAV), de forma a contribuir para a melhoria de cuidados. Método: paradigma qualitativo, exploratório e descritivo, entrevista semiestruturada dirigida a enfermeiros e médicos de uma unidade de cuidados intensivos e de uma equipa intra-hospitalar de suporte em cuidados paliativos de um hospital de agudos. Achados submetidos a análise de conteúdo. Os procedimentos ético-moral foram respeitados. Resultados: os profissionais de saúde entendem a DAV como um instrumento que oferece informação relativa às vontades da pessoa doente. Identificou-se ainda, que os participantes entendem que para cumprirem a DAV, tenham que ser colmatadas diversas necessidades, nomeadamente: formação; maior divulgação e informação; criação de sistemas de alerta; maior sensibilização para a gestão da DAV e maior objetividade nas decisões tomadas pela equipa. Conclusão: os profissionais de saúde estão despertos para a problemática que envolve a DAV, reconhecendo necessidades para uma intervenção sustentada e que dê resposta às vontades expressas pela pessoa em fim de vida. Focam a formação, o marketing, o conhecimento e a comunicação como fatores relevantes para a tomada de decisão. Nesta ótica é fundamental que os profissionais de saúde foquem a pessoa como um fundamento da ética, em que autonomia individual e a relação interpessoal sejam aspetos tidos em consideração para a humanização dos cuidados. Descritores: Testamentos quanto à vida; Profissionais de Saúde; Cuidados de Enfermagem.

ABSTRACT

Objective: to understand the perception of health professionals in complying with the Advance Directive (AD), in order to contribute to improving care. Method: qualitative, exploratory and descriptive paradigm, semi-structured interview aimed at nurses and doctors from an intensive care unit and an intra-hospital support team in palliative care at an acute hospital. Findings subjected to content analysis. Ethical-moral procedures were respected. Results: health professionals understand the AD as an instrument that offers information regarding the wishes of the sick person. It was also identified that participants understand that in order to comply with the AD, several needs must be met, namely: training; greater dissemination and information; creation of alert systems; greater awareness of AD management and greater objectivity in the decisions made by the team. Conclusion: health professionals are aware of the issues surrounding AD, recognizing the need for sustained intervention that responds to the wishes expressed by the person at the end of life. They focus on training, marketing, knowledge and communication as relevant factors for decision making. From this perspective, it is essential that health professionals focus on the person as a foundation of ethics, in which individual autonomy and interpersonal relationships are aspects taken into consideration for the humanization of care.

Descriptors: Testaments regarding life; Health professionals; Nursing care. 

RESUMEN

Objetivo: comprender la percepción de los profesionales de la salud sobre el cumplimiento de la Voluntades Anticipadas (VA), para contribuir a la mejora de la atención. Método: paradigma cualitativo, exploratorio y descriptivo, entrevista semiestructurada dirigida a enfermeros y médicos de una unidad de cuidados intensivos y de un equipo de apoyo intrahospitalario en cuidados paliativos de un hospital de agudos. Hallazgos sujetos a análisis de contenido. Se respetaron los procedimientos ético-morales. Resultados: los profesionales de la salud entienden la VA como un instrumento que ofrece información sobre los deseos del paciente. También se identificó que los participantes entienden que para cumplir con la VA se deben cubrir varias necesidades, a saber: capacitación; mayor difusión e información; creación de sistemas de alerta; mayor conciencia en la gestión de VA y mayor objetividad en las decisiones tomadas por el equipo. Conclusión: los profesionales de la salud son conscientes de las problemáticas que rodean la VA, reconociendo la necesidad de una intervención sostenida que responda a los deseos expresados ​​por la persona al final de la vida. Se centran en la formación, el marketing, el conocimiento y la comunicación como factores relevantes para la toma de decisiones. Desde esta perspectiva, es fundamental que los profesionales de la salud enfoquen a la persona como fundamento de la ética, en la que la autonomía individual y las relaciones interpersonales sean aspectos tomados en consideración para la humanización del cuidado.

Descriptores: Voluntad en Vida; Profesionales de la salud; Cuidado de enfermera.

Tipo de artigo:ARTIGO ORIGINAL

Recebido:07/08/2024 aprovado:16/09/2024

INTRODUÇÃO

Ao longo dos anos, muito se tem falado, escrito e debatido sobre o tema dos cuidados paliativos, da morte, do sofrimento, mas devido ao modelo biomédico predominante no século XX, caracterizado por uma abordagem mecanicista, tecnicista, que enfatiza o corpo, tem trazido aos profissionais de saúde questões em torno do sofrimento e do sentido da vida de quem enfrenta o processo de morrer.

Para Hassegawa et.al, protelar a morte está diretamente relacionado com as novas tecnologias médicas, fascinando assim as pessoas e os profissionais de saúde (1).

De facto, quando os profissionais de saúde se deparam com o fim de vida sentem que os seus cuidados terão que atender à multidimensionalidade da pessoa, não encarando esta apenas como um fenômeno biológico, mas como alguém que está afetado na sua dimensão psíquica, social e espiritual. Neste sentido, a prevenção, a identificação precoce e a gestão dos problemas presentes, exige apoio que permita à pessoa doente viver de modo mais pleno até ao final, utilizando-se a comunicação efetiva e integrando a pessoa doente e família no planeamento dos cuidados (2). 

A defesa social por cuidados humanos, focando a pessoa doente como sujeito decisor no processo de cuidados, tem levado a uma maior consciencialização das equipas de saúde relativo ao papel da pessoa doente no exercício da sua autonomia, expresso através do consentimento informado e do testamento vital.

O respeito pela autonomia da pessoa que enfrenta o processo de morrer, remete-nos para o seu próprio conceito, tal como define Aristóteles a qualidade singular do homem - a racionalidade. De facto, a diretiva antecipada de vontade une a decisão da pessoa doente relativo à aceitação ou rejeição de determinado tratamento à decisão médica.  

Realça-se que a Lei n.º 25/2012, de 16 de julho estabelece que a vontade da pessoa deve ser assegurada no que se refere aos tratamentos que deseja ou não receber, perante determinadas situações de saúde, dando assim enfoque à autodeterminação. Neste sentido, a diretiva antecipada de vontade é de facto, um instrumento legal que permite a exposição das vontades da pessoa quanto aos cuidados a receber no final da vida. Ela surge efetivamente, da necessidade de garantir o princípio da autonomia da pessoa doente perante a evolução da medicina que procura superar a morte (3).

Atendendo a todos estes pressupostos, colocamos a questão de investigação: Qual a perceção dos profissionais de saúde no cumprimento da Diretiva Antecipada de Vontade, no cuidar da pessoa em fim de vida, tendo por objetivo: conhecer a perceção dos profissionais de saúde no cumprimento da Diretiva Antecipada de Vontade no cuidar da pessoa em fim de vida, com a intencionalidade de contribuir para a melhoria dos cuidados prestados à pessoa e família que enfrentam o fim de vida.

ENQUADRAMENTO

Procurar o sentido da vida é um aspeto individual e exclusivo da pessoa. Mas, o que se considera ser pessoa? É de facto uma tarefa difícil, na medida em que é complexo, único e irrepetível. Existe de facto, uma dimensão holística, que significa mais do que a soma da dimensão física, psicológica, social e espiritual.  É com base numa atenção integral centrada na pessoa doente e numa avaliação multidimensional que conseguimos dar ênfase à qualidade de vida, quer da pessoa doente, quer da família (4). 

Já Leloup (5) apresentava quatro correntes de visão do homem no mundo contemporâneo: 1) unidimensional – o homem não passa mais do que um corpo, uma matéria e a morte é o fim da vida; 2) bidimensional – observa-se o homem como corpo animado, isto é, possui uma alma imortal, que lhe dá vida; 3) tridimensional – nesta visão, o homem é composto por alma, corpo e espírito; 4) quaternal – respeita o homem na sua inteireza, corpo, alma e espírito, ligando-os entre si, abrindo e descondicionando as dimensões afetivas ou intelectuais.

Permitir à pessoa que enfrenta a última etapa da vida, viver os últimos dias com significado e dignidade é um imperativo ético no cuidar do profissional de saúde, especialmente no contexto de fim de vida, devido ao confronto com a finitude, sendo os princípios dos Cuidados Paliativos uma atitude e sinónimo de garantia de dignidade no final da vida de cada pessoa.

Tal como Capelas, et al. (6) refere os Cuidados Paliativos são uma área especializada dos cuidados de saúde onde o foco central são as necessidades da pessoa doente e a intervenção se foca na minimização do sofrimento.

Rodeados por um mundo que não nos ensina a morrer, mas incita-nos a viver, sentimo-nos incompetentes para responder a questionamentos sobre o querer viver ou querer morrer, que emergem das profundezas de cada pessoa por ocasião das crises, sofrimento e morte. Quando o doente pressente que vai morrer, ele faz um inventário da vida, tenta reorganizá-la em termos materiais e relacionais e transformá-la de forma a aprimorar a sua existência. Mas, quando uma pessoa reconhece a possibilidade da iminência da sua própria morte, geralmente ela prefere uma morte curta a uma vida a qualquer preço. Neste sentido, é fundamental privilegiar a tomada de decisão da pessoa doente, facilitando desta forma o garante da sua vontade quando esta não tenha capacidade cognitiva para decidir (7).

Salienta o Conselho da Europa que a pessoa deve ser apoiada no final de vida atendendo a três princípios: consagrar e defender os direitos dos doentes incuráveis a intervenções completas de cuidados paliativos; proteger os direitos dos doentes incuráveis à sua própria escolha e manter a interdição absoluta de intencionalmente se por fim à vida os doentes incuráveis. 

Partindo de todos estes pressupostos, cabe ao profissional de saúde salvaguardar que as diretivas antecipadas de vontade não deverão ser entendidas como um fim em si mesmo, mas um meio para encorajar a revisão da vida para ajudar a reconhecer propósito, valor e significado; explorando assuntos de culpa, remorso, perdão e reconciliação; facilitando a expressão religiosa, espiritual de forma a permitir uma maior perceção do seu controle sobre a decisão a ser tomada sobre si (8). Para Dadalto et al. as Diretivas Antecipadas de Vontade funcionam como: “condão de auxiliar o cidadão que deseja fazer a sua diretiva antecipada, bem como os médicos que desejam apresentar essa possibilidade para os seus pacientes, mas deve ser sempre utilizado como guia e não como um modelo fechado às peculiaridades de cada situação concreta (7).” Para Saccol o Testamento Vital é um alicerce fundamental para as tomadas de decisão no final da vida, as quais, habitualmente são acompanhadas de grande vulnerabilidade e incapacidade física e cognitiva (9).

Efetivamente o processo de tomada de decisão é de grande complexidade que exige ao profissional de saúde uma análise crítica e em equipa de saúde. Enfrentar as vontades expressas pela pessoa doente coloca ao profissional de saúde diversas questões, nomeadamente qual o sentido da vida, qual o nosso poder, como devemos agir perante o princípio da autonomia da pessoa? Portanto, enfrentar uma vontade expressa precipita uma reavaliação de muitos aspectos da vida, incluindo a própria vida, e a reformulação do caos existente. Como referem Nunes & Melo foi “esta, talvez, uma das grandes transformações culturais do final do século XX: a evolução para uma ética centrada na dignidade da pessoa e no seu direito à liberdade e à autodeterminação” (10).

Do exposto, se compreende a relevância da Diretiva Antecipada de Vontade que, em certas condições, constituirá o único meio de suprir a falta de consentimento, pela incapacidade da pessoa doente em exercer a sua autonomia no momento da proposta. Este instrumento, poderá inclusive, ser perspectivado como resposta à exigência de uma igualdade de oportunidades no campo da saúde, atendendo às necessidades dos mais desfavorecidos neste contexto, que serão as pessoas incapazes de usufruir de autonomia.

Tudo isto exige, um olhar atento do ser humano, com o intuito de compreender quais as consequências existentes na vida humana, em especial, quais as necessidades para o desenvolvimento e autonomia da pessoa e em que condições essa evolução tecnológica pode ser também um progresso humano.

Questão de Investigação:

Qual a perceção dos profissionais de saúde no cumprimento da Diretiva Antecipada de Vontade, no cuidar da pessoa em fim de vida?

MÉTODO

Atendendo ao problema de investigação e aos objetivos do estudo, optamos pelo paradigma qualitativo, um estudo exploratório descritivo simples, pois serve para “identificar as características de um fenômeno de maneira a obter uma visão geral de uma situação ou de uma população” (11). Ao procurar conhecer a perceção dos profissionais de saúde no cumprimento da DAV o estudo desenvolveu-se numa unidade de cuidados intensivos e na equipa de suporte em cuidados paliativos num hospital de agudos.

Os participantes do estudo foram enfermeiros e médicos destas unidades de saúde, dando resposta aos critérios de inclusão: médicos e enfermeiros com experiência profissional superior a um ano, a exercer funções nas respetivas unidades. Participaram no estudo 15 profissionais de saúde 11 profissionais de saúde de uma Unidade de Cuidados Intensivos (UCI) e 4 profissionais de saúde de uma Equipa Intra Hospitalar de Suporte em Cuidados Paliativos (EIHSCP), número obtido após saturação de dados, ou seja, não emergiram novos dados significativos que dessem resposta aos objetivos. Passamos de seguida à caracterização dos participantes: 8 do sexo feminino, 7 do sexo masculino, com idades compreendidas entre os 30 e 61 anos e tempo de serviço na UCI/EIHSCP entre os 1 e 20 anos. Quanto à formação académica, 3 têm licenciatura em enfermagem, 3 têm especialidade em enfermagem de reabilitação, 1 especialista em enfermagem médico-cirúrgica e 2 com mestrado em cuidados paliativos. No que concerne ao grupo profissional médico: 6 são médicos, 2 possuem mestrado integrado e especialidade em medicina geral e familiar e 4 com mestrado integrado e especialidade em medicina interna. 

Optou-se por realizar entrevistas individuais através de um guião composto por entrevistas semiestruturadas, realizado a médicos e enfermeiros das unidades acima referidas. Foi assim, uma amostra intencional na medida em que foi constituída por pessoas de fácil acesso e que davam resposta aos critérios de inclusão. Elaborou-se um guião de entrevista atendendo aos objetivos de estudo, com as seguintes questões semiabertas (gostaria que me relatasse qual a sua perceção ao cumprimento da diretiva antecipada de vontade? que necessidades/dificuldades se depara no seu quotidiano? que sugestões deixa?), que permitiram ao entrevistado explanar conceitos, ideias, opiniões e experiências. Foi garantido o sigilo e confidencialidade dos dados dos profissionais de saúde, assim como a sua utilização, respeitando o regulamento geral da proteção de dados. Foram cumpridos, assim, todos os procedimentos éticos e legais. O estudo teve parecer favorável (n. º 50/2018 – CES) da comissão de ética do hospital.

Os dados obtidos foram submetidos à análise de conteúdo, de acordo com Bardin (12). Tendo se organizado em torno das diferentes fases da análise de conteúdo: 1. pré-análise, cumprindo algumas regras, regras de exaustividade, representatividade, homogeneidade e pertinência; 2. exploração de material, onde este foi submetido a codificação e por fim; 3. a inferências e interpretação dos resultados.

RESULTADOS

Os relatos dos profissionais de saúde indicam que a sua perceção sobre a DAV se relaciona com o conceito que eles lhe atribuem. Emergiram vários conceitos, nomeadamente: Informação formal relativa à vontade do doente acerca dos cuidados de saúde em fim de vida; definição pelo doente de cuidados a receber em situações de grande complexidade; definição pelo doente de um procurador em caso de inconsciência; manifestação antecipada dos desejos do doente acerca dos tratamentos a receber; decisão consciente dos tratamentos a receber no final de vida, conforme evidencia alguns dos enxertos: “(…) documento legal que deixam os pacientes, com as medidas que eles aceitam serem tomadas, para quando chegar uma fase mais terminal, em que eles possam ou não, relembrar essas vontades (…)” EI6;  “(…) poderá definir um procurador, em caso de estar inconsciente, pode ser um ou mais que um, pode tomar ele a decisão (…)” EI2.

Evidenciaram como necessidades para o cumprimento da DAV: maior Divulgação; sistema de alerta; mais Informação; maior sensibilização dos profissionais de saúde para a gestão da Diretiva Antecipada de Vontade; maior objetividade no fundamento das decisões tomadas pela equipa, conforme demostram alguns enxertos: “(…) para ser cumprida acho que os profissionais de saúde deviam ter mais formação sobre isso (…)” EI2

Teria que ser formação populacional, não sei muito bem, em que moldes, para poder chegar até às pessoas, se através dos meios de comunicação social, televisão, se nas escolas, se com os médicos de família (…)” MI11 “(…) necessidades, na maioria das vezes, prende-se com a falta de informação (…)” EI10

DISCUSSÃO

Constituindo-se a pessoa em fim de vida foco de atenção dos cuidados de saúde torna-se pertinente que os profissionais de saúde respeitem um conjunto de valores, princípios, desejos, conciliando instrumentos de desburocratização e de otimização de recursos, orientando-se sobretudo para cuidados de saúde humanos.

Os achados traduzem as preocupações dos profissionais de saúde em relação ao cumprimento da Diretiva Antecipada de Vontade. Eles enfocam que para dar cumprimento à mesma há necessidades que têm que ser colmatadas. Neste sentido, é necessária formação o que corrobora Rodrigues, que verificou a importância de munir os profissionais de saúde de formação sobre a Diretiva Antecipada de Vontade (14).

Verificamos também que os profissionais de saúde consideram a Diretiva Antecipada de Vontade como um fator potenciador para a proteção da autonomia da pessoa em fim de vida. Contudo a evidência científica vem demonstrando que existem profissionais de saúde com pouca informação à cerca das estratégias de cumprimento da Diretiva Antecipada de Vontade (15). Neste sentido, há necessidade de mais formação, mais informação, maior divulgação, maior sensibilização dos profissionais de saúde e existência de sinais de alerta.

A necessidade de mais formação neste âmbito é destacada por vários autores, nomeadamente, Chehuen Neto (15); Hassegawa et al. (1); Cogo et al. (16) e Saioron et al (17).

Obter informação é destacada pelos profissionais de saúde como fundamental para tomar decisões conscientes e para um maior envolvimento com o processo em fim de vida e como tal para dar resposta às vontades expressas pela pessoa doente. Dar autonomia ao doente é respeitar a pessoa como um todo e responsabilizar todos os envolvidos na ação.

De facto, “a consciencialização da morte é um processo que diz respeito não só à pessoa em fim de vida, mas é uma responsabilidade de todos os que o rodeiam” (18). 

Dar a oportunidade a que a pessoa em fim de vida e família se envolvam como sujeitos ativos no processo de doença e façam parte da equipa de saúde, exige que os profissionais de saúde abandonem o modelo paternalista, pois a vida aproxima-se irreversivelmente do seu fim.

As Diretivas Antecipadas de Vontade estão previstas na lei desde de 2012, contudo ainda é relativamente infrequente, depararmo-nos com doentes que expressem as suas Diretiva Antecipada de Vontade (19).

Noutro estudo de Soares, Pinho e Costa (20) é reforçada a importância de a pessoa doente estar informada para que possa exercer o seu princípio de autonomia em relação a rejeitar ou aceitar cuidados quando se deparam com uma situação de fim de vida.

Cogo et al. (16) na sua pesquisa verificou que as informações escritas relativas às vontades do doente não são comuns devido em grande parte ao desconhecimento dos cidadãos acerca do conceito e da forma como podem realizar a diretiva antecipada de vontade.

Maior sensibilização dos profissionais de saúde para a gestão da Diretiva Antecipada de Vontade é outra necessidade manifestada para o cumprimento da Diretiva Antecipada de Vontade. Cogo et al. (16), defendem que é necessário sensibilizar mais os profissionais de saúde sobre o uso da Diretiva Antecipada de Vontade, no sentido de se aumentar a sua implementação e a sua aplicabilidade. Da mesma forma, Velasco-Sanz & Rayón-Valpuesta (21), mencionam que apesar dos profissionais de saúde terem uma atitude favorável relativamente ao Testamento Vital, muitos deles, nem sequer sabem se os seus utentes têm um Testamento Vital preenchido.

A criação de um Sistema de Alerta foi também uma necessidade apontada pelos profissionais de saúde, para cumprir a Diretiva Antecipada de Vontade. Para Chehuen Neto (15), as Diretivas Antecipadas de Vontade devem ser de fácil acesso no processo clínico do doente, de forma a serem rapidamente visualizadas.

CONCLUSÃO

As necessidades encontradas na prática clínica para o cumprimento da Diretiva Antecipada de Vontade prendem-se com mais formação especifica na área; uma maior divulgação; a criação de sistema de alerta para os profissionais de saúde; mais informação tanto através dos profissionais de saúde, como através da divulgação nos meios de informação; uma maior sensibilização dos profissionais de saúde para os aspetos relacionados com Diretiva Antecipada de Vontade e por fim uma maior objetividade no fundamento das decisões tomadas pela equipa.

Os profissionais de saúde devem valorizar o modelo humanista, sendo norteador da prática de cuidados. 

Na prática clínica é imprescindível uma maior sensibilização dos profissionais de saúde sobre importância da Diretiva Antecipada de Vontade no doente sem perspetiva de cura; 

Realça-se assim, a necessidade de os profissionais de saúde apostarem em modelos de cuidados centrados na pessoa doente onde este seja focado como sujeito de cuidados. 

Parece podermos afirmar, a necessidade de apostar numa mudança de metodologias do cuidar, promovendo uma visão integral da pessoa e, deste modo, a dignificação do processo de fim da vida, tendo em conta a vontade do doente.

REFERÊNCIAS

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